Tudo ao molho e fé em Deus - Cantos do cisne
Pedro Azevedo
No futebol português, os árbitros parecem nutrir especial simpatia por quem os intimida. Não há revolta nem indignação perante a opressão, apenas afecto e compaixão, um estado psicológico vulgarmente denominado de Síndrome de Estocolmo, em alusão à reacção dos reféns sequestrados no Kreditbanken daquela cidade em 1973. Nesse transe, qualquer tipo de possibilidade de libertação é vista como uma ameaça, ou não estivesse ainda bem presente na mente dos árbitros a invasão ao Centro de Treinos da Maia, ou pedidos presidenciais de veto a um certo árbitro. Isto não é verdade, é veríssimo. Aliás, Veríssimo. Talvez por isso, uma falta duríssima de Felipe sobre Bruno Fernandes, a qual, para além do mais, evitou um promissor contra-ataque leonino, pôde passar em claro sem admoestação, mas a contenção digna de elogio de Acuña perante múltiplas agressões consecutivas acabou "premiada" com um cartão amarelo. Toda uma quantidade de decisões aberrantes que atingiram uma proporção tão inimaginável este ano quanto a outrora remota possibilidade deste Vosso escriba pensar em recomendar aos dirigentes do seu clube que comecem a estudar a possibilidade de integrarem a La Liga.
Por um lado, se calhar até devemos estar agradecidos a Fábio Veríssimo por ter expulso Borja, um ilusionista da bola, evitando assim um bem possível Jamor de perdição para o colombiano sob a forma de um daqueles lances fatais (3 nos últimos 3 jogos) em que ele está lá mas a culpa parece sempre ser exclusiva de outrém. Por outro, aproveitando a maré, penso que é de repreendê-lo por nada ter feito para evitar que Bruno Gaspar tenha ido a jogo. Se lhe tivesse dado um cartão vermelho antes da partida ter começado, talvez Keizer se visse obrigado a ir ao estágio da selecção de sub-20 resgatar Thierry Correia. Também se teria evitado aquele passe despropositado do lateral direito que nos fez ficar a jogar com 10 elementos desde os 17 minutos, embora Borja não tenha ficado isento de culpas, ele que pareceu ter engatado mal a mudança e assim permitiu a Corona, que partiu uns bons 3 metros atrás, ganhar-lhe a dianteira. Em todo o caso, como atenuante para o árbitro, é de destacar o facto de desta vez Petrovic e André Pinto terem mantido a integridade dos seus narizes, algo que a dado momento pareceu pouco plausível perante a impetuosidade dos "sarrafeiros" (que o diga Felipe) jogadores portistas.
Já a Keizer não podemos estar muito agradecidos: aquela sua obstinação em manter Bruno Fernandes deverá ter provocado alguns AVCs entre os mais fervorosos adeptos dos leões e poderia ter custado a ausência do nosso capitão no Jamor. É que a partir de certo momento tornou-se claro para todos menos para o holandês que Bruno e Acuña estavam marcados pelos portistas, facto evidenciado em todo o seu esplendor na confusão criada à volta do argentino no lance do qual, ironia do destino, resultou a expulsão de Corona.
Apesar da inferioridade numérica, o Sporting até se colocou em vantagem: Acuña fez barba e cabelo, primeiro num corte a um adversário com pêlo na venta, depois a assistir Luíz Phellype, dando pelo meio um bigode a uns opositores cheios de vontade de lhe retribuirem com uma "pêra". O Felipe das Consoantes também não se fez rogado e marcou o seu oitavo golo em outros tantos jogos. Pena que a equipa tenha estado desastrada nos cantos, perdendo diversos duelos com os seus adversários, deles resultando os dois golos portistas marcados no limite do fora-de-jogo. Mathieu, Renan, Acuña e Luíz Phellype, os melhores leões nesta noite, não mereciam tamanha traição de uma marcação tipo Zona J, que nos deixou socialmente excluídos dos três pontos.
Tenor "Tudo ao molho...": Marcos Acuña