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Castigo Máximo

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

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Castigo Máximo

14
Ago19

O amor é... por José Duarte(*)


Pedro Azevedo

Há um Sporting que reside dentro de cada um. O último bastião do sportinguismo são as nossas memórias individuais. Elas são intemporais (ao ganharem vida deixam de estar datadas), incorruptíveis, inalienáveis. É a elas que recorro frequentemente perante conjunturas adversas, nomeadamente ao tempo em que era menino e como menino que era não tinha filtros nem preconceitos e absorvia como uma esponja tudo o que dissesse respeito ao Sporting que para mim era relevante: aquele que entrava em campo aos Domingos, não o dos gabinetes. Foi a pensar nessas memórias (e não na conjuntura) que pedi a autores consagrados da blogosfera que escrevessem sobre o seu Sporting. 

 

Hoje convido o José Duarte, a.k.a. "Leão de Alvalade". Novo nestas lides, ia lendo esporadicamente o "A Norte de Alvalade", o blogue do qual o José Duarte é autor, quando um dia me deparei com um texto genial, de um humor temperado das proporções certas de inteligência, fina ironia e prazeiroso sarcasmo, que aqui recordo, recomendando-o vivamente a quem não teve oportunidade de lêr. Como quem me acompanha se vai apercebendo, a ironia é uma ferramenta essencial ao meu bem-estar: na sua companhia poupei-me a levar demasiadamente a sério a minha existência, evitando aquele deslumbramento tão enganador que nos faz descolar da nossa humanidade e perder as referências; com ela, em tempos de cólera no meu clube, não deixando de criticar aquilo que não me parece bem, tenho feito o que me é possível para passar uma mensagem que não aumente a temperatura e adicione ruído numa era em que os sócios do Sporting se veem permanentemente obrigados a viver encostados a uma coluna a bombar de uma discoteca. Ora, este supracitado texto do José foi para mim um sortilégio, ou seja, um bocadinho de magia, como um dia ouvi definir num pequeno café na Boulevard St Michel, ali no Quartier Latin. A partir daí tornei-me leitor assíduo do blogue, pese embora nem sempre o José siga a sua orientação editorial nesse sentido que tanto me agrada. A inteligência numa pessoa foi sempre algo que me fascinou, a humildade também. Neste breve contacto que mantivémos a propósito do meu pedido para colaborar nesta série, o José mostrou-me uma faceta humilde que só se encontra nos verdadeiramente grandes. É por isso com redobrado prazer que sem mais demora aqui vos deixo o texto que o José Duarte, "um leão a Norte, onde se é leão por convicção", escreveu por amor ao Sporting:

 

"Ser especial é ser de um clube especial.

 

Sou daquelas pessoas que tanto confia quase cegamente como se transforma num ensimesmado patológico, quando alguma coisa parece não bater certo. Foi o caso deste convite do Pedro Azevedo em escrever um artigo para o seu blogue. Comecei por me perguntar "porque raio alguém que escreve tão bem sobre o Sporting" quer umas linhas minhas, eu que escrevo cada vez mais esparsamente, cada vez mais de forma superficial e de escrita cheia de lugares comuns? 

A dúvida foi crescendo ao ler o texto do Rui Monteiro, cuja escrita deliciosamente mordaz admiro. Ao dar de caras, quase de seguida com o do Pedro Correia, a quem fiquei a dever um artigo que não fui capaz de concluir, ainda mais hesitante fiquei. Mas a vaidade, que a tantos perde, preparou-se para fazer mais uma vítima e aqui estou eu.

A verdade é que eu nem sequer sou um bom exemplo de Sportinguista. Não o sou de berço nem de tenra idade, porque o futebol ou o desporto em geral não eram tema de conversa em casa, apesar do meu pai ser sportinguista. Se tivesse que ser de algum clube por influência familiar certamente que seria benfiquista, uma alegria que não consegui dar à minha querida Tia Ly. Fervorosa adepta do nosso rival, ouvia os relatos religiosamente e até cuidou de me oferecer um equipamento completo, que ainda assim não foi suficiente para me evangelizar para a sua causa.

Não sei precisar quando despertou em mim o interesse pelo Sporting. Mas sei exactamente o momento em que percebi que era uma paixão que iria ficar para toda a vida. Falo mais precisamente do dia 22 de Agosto de de 1981 quando, de férias em Lisboa, e valendo-me da desculpa de um passeio, entro sozinho na superior sul do velhinho Alvalade e assisto à inauguração do campeonato nacional 1981/82. 

Aqueles nomes que eu só conhecia de ouvir falar, de ver fotografias nos jornais ou de aparecer na televisão estavam ali à minha frente em carne e osso. O bigode do Meszaros, a elegância que fazia do difícil fácil do Eurico, os bailados felinos do Jordão (marcou 2 golos, selando assim para sempre a condição de ídolo intemporal) ou a geometria aplicada de Oliveira, tudo parecia ali ao alcance. O Sporting tinha um treinador novo, cuja memória fez questão de arquivar de camisa branca e charuto, e que se fazia acompanhar de um preparador físico "diferente" de nome Roger Spry. Factos que tomara conhecimento previamente no jornal "A Bola" cujos fascículos desse verão versando a contratação do mago Oliveira me tinham arruinado e eu havia devorado com avidez.

Ainda hoje não consigo explicar a razão da empatia imediata que então me envolveu na grandiosidade daquele cenário vibrante. Era como se eu sempre tivesse estado ali e era seguramente ali que eu ia pertencer para o que restasse dos meus dias. Havia como que uma magia no ar, tudo me parecia grandioso, belo, magnífico. Quando no final do dia tentei adormecer as emoções, já depois de tranquilizar os meus tios assustados pela surpresa pouco habitual da ausência prolongada, tive uma tarefa morosa. 

Nem o facto de o resultado ter sido tão decepcionante  como a frouxidão da exibição diminuiu o efeito do encantamento. Sofremos para alcançar o empate, o Belenenses fez-nos a vida negra mesmo terminando com um guarda-redes improvisado na baliza. Não o sabia então que na minha estreia em Alvalade seria imediatamente vacinado contra todo o qualquer desgosto ou infortúnio. A glória do nosso lema haveria de se cumprir no final de época, engalanada numa apetitosa dobradinha.

Como todos os amores esta relação teve altos e baixos. Os embaraços e tristezas, porém, têm uma dimensão microscópica quando ombreiam com o orgulho que sinto em ser e dizer que sou Sportinguista. O encantamento do primeiro encontro em Alvalade era apenas a semente do que se haveria de transformar numa paixão perene alimentada pelo sentimento de pertença a uma instituição especial. Mais do que diferente, como muitas vezes é designado, é especial.

Fundado por aristocratas ainda no regime monárquico, tornou-se num clube de dimensão nacional e popular de forma transversal a toda a sociedade portuguesa, quando o mais natural é que se tivesse ficado na exclusividade de um grupo restrito. Percursor, pioneiro e ecléctico, colecionador de medalhas e recordes olímpicos e mundiais, formador de melhores do mundo e campeões europeus, cumpriu o sonho de ser tão grande como os maiores da Europa.

Um desígnio que sempre que é cumprido tem de ser outras tantas vezes recomeçado. Esse permanentemente sobressalto é a armadilha perfeita para o coração cujo sentimento de pertença ao clube dos  Stromp, de Jorge Vieira, Azevedo, do Zé da Europa, Peyroteo, dos 5 Violinos, do Damas, do Agostinho, do Livramento, Moniz Pereira, Carlos Lopes tantos outros me faz sentir especial. Ser do Sporting foi uma escolha especial."

 

(*) José Duarte, autor de "A Norte de Alvalade"

 

P.S. Mais autores da blogosfera passarão por aqui, mas no entretanto abro este espaço aos leitores que se queiram candidatar a escrever sobre o seu amor ao Sporting. Bastará para tal enviarem um texto com o título "O amor é..." para a caixa de comentários de um qualquer dos meus Posts. 

13
Ago19

O amor é... por Pedro Correia(*)


Pedro Azevedo

Há um Sporting que reside dentro de cada um. O último bastião do sportinguismo são as nossas memórias individuais. Elas são intemporais (ao ganharem vida deixam de estar datadas), incorruptíveis, inalienáveis. É a elas que recorro frequentemente perante conjunturas adversas, nomeadamente ao tempo em que era menino e como menino que era não tinha filtros nem preconceitos e absorvia como uma esponja tudo o que dissesse respeito ao Sporting que para mim era relevante: aquele que entrava em campo aos Domingos, não o dos gabinetes. Foi a pensar nessas memórias (e não na conjuntura) que pedi a autores consagrados da blogosfera que escrevessem sobre o seu Sporting. 

 

Hoje convido o Pedro Correia. Antes de mais, cumpre-me a obrigação de informar que se estou presente na blogosfera devo-o ao Pedro (se não gostarem de me lêr, já sabem para onde enviar a factura), algo de que nunca me esqueço. Foi ele, sem me conhecer, que um dia me desafiou para alinhar no plantel do "És a nossa FÉ" e assim poder ter o privilégio de escrever sobre a minha primeira importante escolha na vida, o Sporting, um amor que não tem fim.

O Pedro tem sido obreiro de vários casos de popularidade: para além do supracitado blogue, de que foi fundador e onde permanece há já largos anos como o co-autor mais influente e profuso, ele é também co-autor do "Delito de Opinião". Cerebral, directo, contundente, provocador por vezes, o Pedro tem um raro instinto para tudo o que possa ser notícia, característica que aliada a uma opinião que procura sempre fundamentar, a uma técnica narrativa irrepreensível e à sagacidade empregue na esgrima de argumentos com os seus leitores o tornam uma figura incontornável da blogosfera. Hoje vão lê-lo porventura num registo um pouco diferente, que isto de falar de amor a um clube obriga-nos a passar a nossa vida em revista. Ilustrando-o, PC enriquece o seu belo texto dando-nos conta de viagens por um mundo onde o Sporting foi sempre uma companhia constante e marcante, sinal inequívoco da implantação de um gigante por vezes sem consciência da sua real relevância social. Sem mais delongas, aqui fica o texto que o Pedro nos deixou por amor ao Sporting:

 

"Amar o Sporting é cultivar alguns dos valores que mais prezo. Ser fiel às origens, às tradições, à devoção clubística – antónimo de clubite. Praticar a lealdade em campo e fora dele, rejeitando golpes baixos. Gostar muito de vencer, sim – mas sem batota. Recusar ódios tribais a pretexto da glória desportiva. Nunca confundir um adversário com um inimigo, sabendo de antemão que o futebol (só para invocar o desporto que entre nós mobiliza mais paixões) é a coisa mais importante das coisas menos importantes, como Jorge Valdano nos ensinou. 

Amo o Sporting pela marca inconfundível do seu ecletismo. Os meus primeiros heróis leoninos, ainda em criança, eram Leões de corpo inteiro sem jogarem futebol. Foi o Joaquim Agostinho a brilhar nos Alpes e a vencer etapas na Volta à França depois de ter sido o maior campeão de ciclismo de todos os tempos em Portugal. Foi o António Livramento, artista exímio com um stick nas mãos, campeão europeu de verde e branco, além de campeão mundial a nível de selecções. Foi o Carlos Lopes, recordista absoluto do corta-mato europeu, brioso herói da estrada, medalha de prata nos 10 mil metros em Montreal, primeiro português a subir ao pódio olímpico, de ouro ao peito, naquela inesquecível maratona de 1984 em Los Angeles.

Amar o Sporting é abraçar o universalismo que fez este nosso centenário clube transbordar os limites físicos do País e galgar fronteiras. Conheci fervorosos sportinguistas nas mais diversas paragens do planeta. Nos confins de Timor, no bulício de Macau, na placidez de Goa – lá estão, com a nossa marca inconfundível, sedes leoninas que funcionam como agregador social naqueles países e territórios, assumindo em simultâneo uma ligação perene a este recanto mais ocidental da Europa. 

Amar o Sporting é cultivar a tenacidade de quem nos soube ensinar, de legado em legado, que nunca se vira a cara à luta. João Azevedo a jogar lesionado entre os postes, só com um braço disponível, enfrentando o Benfica num dos clássicos cuja memória perdurou através das gerações. Fernando Mendes, um dos esteios do onze que conquistou a Taça das Taças em 1964, alvo de uma lesão no ano seguinte que o afastou para a prática do futebol, mas capaz de conduzir a equipa, já como treinador, ao título de 1980. Francis Obikwelu, nigeriano naturalizado português e brioso atleta leonino que saltou da construção civil onde modestamente ganhava a vida para o ouro nas pistas europeias em 2002, 2006 e 2011. 

Campeões com talento, campeões com garra, campeões inquebrantáveis – mas também campeões humildes, conscientes de que nenhum homem é uma ilha e um desportista, por mais aplausos momentâneos que suscite, é apenas uma parcela de um vasto arquipélago já existente quando surgiu e destinado a perdurar muito para além dele. Na Academia de Alcochete, no Estádio José Alvalade, no Pavilhão João Rocha, somos conscientes disto: ninguém ganha sozinho. Antes de Cristiano Ronaldo havia um Aurélio Pereira, antes de Livramento havia um Torcato Ferreira, antes de Carlos Lopes havia um Mário Moniz Pereira.

O desporto com a genuína marca leonina não cava trincheiras: estende pontes, transmitindo a pedagogia da tolerância e cultivando a convivência entre mulheres e homens de diferentes culturas, ideologias, crenças e gerações. 

É também por isto que amo o Sporting: fez-me sempre descobrir mais pontes que trincheiras. O que assume relevância não apenas no desporto: é igualmente uma singular lição de vida."

 

(*) Pedro Correia, fundador e co-autor de "És a nossa FÉ", co-autor de "Delito de Opinião"

12
Ago19

O amor é... por Joana Marques(*)


Pedro Azevedo

Há um Sporting que reside dentro de cada um. O último bastião do sportinguismo são as nossas memórias individuais. Elas são intemporais (ao ganharem vida deixam de estar datadas), incorruptíveis, inalienáveis. É a elas que recorro frequentemente perante conjunturas adversas, nomeadamente ao tempo em que era menino e como menino que era não tinha filtros nem preconceitos e absorvia como uma esponja tudo o que dissesse respeito ao Sporting que para mim era relevante: aquele que entrava em campo aos Domingos, não o dos gabinetes. Foi a pensar nessas memórias (e não na conjuntura) que pedi a autores consagrados da blogosfera que escrevessem sobre o seu Sporting. 

 

Hoje convido uma senhora, ou melhor (para que não fiquem dúvidas sobre a sua idade e jovialidade), uma menina, mulher, menina mulher, casada, mãe de 2 filhas e com outra a caminho, a Joana Marques. Há alguns meses atrás, mão amiga trouxe ao meu conhecimento a Joana. No seu blogue escrevera algo sobre o Sporting que eu deveria lêr, dizia o meu amigo. Li. E aquilo tocou-me. Tocou-me pelo estilo de escrita de cunho muito próprio e intimista, pela forma como os seus textos ganhavam vida com a sintaxe por via de uma invulgar e ousada disposição das frases (a indicar uma personalidade muito vincada), mas também (principalmente) pela forma como conseguira traduzir a sua paixão pelo nosso clube. Foi a primeira vez que li o "Feita de Sporting", que mais tarde vi traduzido pelo nosso marketing em "Feito de Sporting", que adicionava as conquistas aos sentimentos. Reli o texto e não esqueci. Não conhecendo a Joana, guardei em ficheiro na minha cabeça para memória futura. E a oportunidade de contacto surgiu com esta série "O amor é...".  Assim, sem mais delongas, esperando ter-lhe feito justiça (há sempre algum pudor e dá sempre um bocadinho de medo apresentar quem acabamos de "conhecer"), aqui fica o texto que a Joana nos escreveu por amor ao Sporting:

 

"Tenho 3 filhas.

Quando penso naquilo que quero para elas peço: saúde, felicidade..

…e que sejam do Sporting.

É por isso que nas noites de mais inspiração, em vez de lhes ler “a Branca de Neve e os 7 anões” lhes conto episódios vividos por mim. Com o Sporting.

Com a Alice e a Mariana ao meu colo e a Luísa dentro da minha barriga, começo devagarinho….

 

Era uma vez….

…há muito, muito tempo.

  1. No Alentejo.

Tinha 6 anos e passava as férias grandes em casa dos meus avós.

Eu, o meu irmão e uma carrada de primos rapazes.

Era levada da breca e tirava a paciência a tudo e a todos.

Era a mais nova.

Hiperactiva. Mimada.

Precisava de atenção e entretenimento constante.

Passávamos os dias a correr atrás do sol e regressávamos a casa ao anoitecer. Lanchávamos a fruta das árvores, bebíamos a água dos fontanários públicos e fazíamos amigos improváveis.

Não havia telemóveis. Toda a gente confiava em nós. Brincávamos como queríamos e onde queríamos.

Os meus pais e os meus tios visitavam-nos ao fim-de-semana. Ao sábado à noite passava um bom par de horas dentro da banheira. No dia seguinte a minha mãe levava-me à missa e não podia ir com aquelas pernas todas encardidas.

 

Os meus pais e os meus tios iam-se embora ao Domingo depois de almoço.

 

 

Um desses domingos. Saíram mais cedo.

Para grande alívio do meu avô.

O campeonato ia começar. O Sporting ia jogar.

Quando o Sporting jogava o mundo parava.

O meu avô, exigia silêncio e atenção.

Sentava-se no sofá da sala com a minha avó ao lado.

Nós sentávamo-nos “à chinês” ao redor do sofá.

Calados que nem ratos. À espera de novidades.

Mas…

….a minha fama era qualquer coisa!

O meu avô confiava no silêncio de todos excepto no meu. Vá se lá saber porquê… ;)

Enquanto sintonizava o rádio chamava-me!

- Joana!

Ficava direitinha e caladinha! Em sentido…

Também eu queria participar do momento.

O meu irmão dizia-me baixinho ao ouvido:

- Se te sentires aborrecida vai por aí tocar às campainhas!

Não fui!

O jogo começou.

Fiquei ali a alimentar o meu Sportinguismo.

O meu avô tinha o rádio ao ouvido.

Nervoso.

Pediu à minha avó ajuda divina.

A minha avó levantou-se e tirou a tampa de uma terrina que tinha em cima da mesa.

Tirou um terço e começou a rezar.

O meu irmão disse-me baixinho ao ouvido...

- A avó está a rezar a Deus para o Sporting ganhar!

 

O Sporting ganhou o jogo!

 O meu avô levantou-se.

Nós fomos atrás dele.

Entrou na adega. 

Saiu de lá com 4 foguetes. 

Lançou-os.

Para que toda a gente soubesse que o Sporting tinha ganho.

 

No fim de semana seguinte  os meus pais voltaram para nos ver e eu tinha uma coisa muito importante para lhes contar.

Mal saíram do carro! Gritei...

- Deus é do Sporting! Deus é do Sporting!

A minha mãe quase enfartou.

O meu pai riu desalmadamente.

Eu, acrescentei:

- O Sporting jogou, a avó rezou a Deus e o Sporting ganhou!!

Feliz da vida, acreditei que o Sporting ia ganhar para sempre.

Deus era do Sporting! Deus era do Sporting!

 

 

O Sporting foi desde o meu primeiro dia de vida o prolongamento da minha família, Alvalade o prolongamento da minha casa.

Actualmente, não sou crente mas tenho uma fé inabalável no meu Sporting.

Tudo pode falhar...

...menos o meu Sportinguismo!

Continuo a acreditar que o Sporting vai ganhar os jogos todos!

Nos ombros, tenho a responsabilidade de transmitir toda esta fé e esta memória às minhas filhas, para que daqui a 20 anos, sejam elas as convidadas a escrever um texto sobre o grande amor das nossas vidas!

 

Obrigada, Pedro!

Tão bom estar por aqui. 💚"

 

(*) Joana Marques, autora de "Kiosk da Joana"

09
Ago19

O amor é... por José da Xã(*)


Pedro Azevedo

Há um Sporting que reside dentro de cada um. O último bastião do sportinguismo são as nossas memórias individuais. Elas são intemporais (ao ganharem vida deixam de estar datadas), incorruptíveis, inalienáveis. É a elas que recorro frequentemente perante conjunturas adversas, nomeadamente ao tempo em que era menino e como menino que era não tinha filtros nem preconceitos e absorvia como uma esponja tudo o que dissesse respeito ao Sporting que para mim era relevante: aquele que entrava em campo aos Domingos, não o dos gabinetes. Foi a pensar nessas memórias (e não na conjuntura) que pedi a autores consagrados da blogosfera que escrevessem sobre o seu Sporting. 

 

Hoje convido o José da Xã. Conheci o José no meu primeiro jantar do blogue “És a nossa FÉ” e logo me impressionou pela sua autenticidade, camaradagem e profunda devoção ao Sporting. Para além disso, o José é um homem bom, genuíno, de princípios,  intuitivo, sábio até, que cultiva a amizade e tem um coração enorme. Os seus Posts são o produto disso mesmo, cheios de puros sentimentos leoninos que nos contagiam, reconciliam com o nosso amor ao clube e, bem absorvidos, nos fazem querer ser melhores Homens. Assim como ele é. Aqui fica o texto que o José nos deixou por amor ao Sporting:

 

"Nasci no seio de uma família de sportinguistas, a começar pelo meu pai, que foi sócio durante algum tempo e pelo meu tio, irmão da minha mãe, que ainda hoje é sócio (creio mesmo que fará parte dos “Cinquentenários”), mas que devido à provecta idade deixou de ir a Alvalade.

Entretanto há umas breves semanas veio-me à memória uma recordação da minha infância que reza assim: certo dia estava eu na aldeia, provavelmente de férias, quando um primo, que se preparava para partir para África ao abrigo do SMO, chamou-me para me mostrar as suas recordações!

Era uma daquelas malas de viagem tão em voga nos anos 60, meia de papelão grosso, meia de madeira, com quadrados de estampagem. Ao abrir a tampa vi que naquele pequeníssimo mundo estava uma história fantástica. O meu primo guardara muitos recortes de jornais que falavam do Sporting, cromos de atletas leoninos muito usados e outras referências sportinguistas.

Foi aquele ínfimo espaço que me fez despertar para uma outra realidade, para algo que hoje reconheço ser mais profundo. Foi nesse momento histórico da minha vida que me tornei verdadeiramente sportinguista.

Após esta minha breve viagem a um passado longínquo mas saudoso, regresso à crua actualidade para afirmar sem rodeios que o Sporting é hoje uma profundíssima paixão.

Recordo agora um outro exemplo de fervor clubístico. Certa tarde após um dia de trabalho e à volta de uma mesa numa tasca na Rua do Cruxifixo e por detrás de umas imperiais alguém perguntou a um sportinguista:

- Entre a tua mulher e o Sporting quem escolherias primeiro?

Resposta rápida:

- O Sporting…

- Porquê?

- Porque conheci primeiro…

Não chegando a este exagero diria que o meu amor pelo Sporting é… totalmente incondicional! E irrevogável!

De outra forma há muito que teria deixado de ser sócio, que não compraria o meu lugar em Alvalade ou que não entraria no Pavilhão João Rocha.

Mas este amor não tem explicação lógica. De todo.

Não se percebe, não se entende, não se controla… só se sente. São as unhas roídas nos minutos finais de um jogo, o frio glaciar naquela grande penalidade, a alma repleta de alegria na vitória, o murro no estômago na derrota.

Nisto a razão não manda, não se impõe.

É o coração leonino que se sobrepõe, é o orgulho, a honra, a alegria de se ser do Sporting Clube de Portugal.

Sentimentos únicos que repito ninguém saberá explicar. Nem eu próprio.

É assim o meu amor ao Sporting!" 

 

(*) José da Xã, autor de "LadosAB", co-autor de "És a nossa FÉ"

 

P.S. "O amor é..." voltará na segunda-feira.

08
Ago19

O amor é... por Rui Monteiro(*)


Pedro Azevedo

Há um Sporting que reside dentro de cada um. O último bastião do sportinguismo são as nossas memórias individuais. Elas são intemporais, incorruptíveis, inalienáveis. É a elas que recorro frequentemente perante conjunturas adversas, nomeadamente ao tempo em que era menino e como menino que era não tinha filtros nem preconceitos e absorvia como uma esponja tudo o que dissesse respeito ao Sporting que para mim era relevante: aquele que entrava em campo aos Domingos, não o dos gabinetes. Foi a pensar nessas memórias (e não na conjuntura) que pedi a autores consagrados da blogosfera que escrevessem sobre o seu Sporting.

 

Hoje apresento o Rui Monteiro. Bom, na verdade o Rui dispensa apresentações, o seu estilo irónico é inconfundível. Ler os seus textos é um renovado prazer. Neles coabitam erudição, inteligência, independência, humor e um sentido de responsabilidade ilustrativo da integridade do autor. Sem mais delongas, aqui fica o texto que o Rui escreveu por amor ao nosso clube:

 

"[O Pedro Azevedo fez a maldade de me pedir um pequeno texto a propósito do Sporting e de uma iniciativa em torno do tema genérico "o amor é...". Os homens não choram, foi assim que o meu pai me ensinou, como tantos outros pais na minha geração. Cada um constrói a carapaça que pode e faz das tripas coração para assim viver a sua vida. Pratico com gosto a ironia, a roçar o cinismo. Não consigo encontrar boa razão para escrever este texto, mas se o Pedro Azevedo mo pede é porque a encontrará seguramente. Tentemos por essa razão.]  

Decorei uma parte da lírica camoniana. Ficou-me de infância e da adolescência e nunca me saiu da cabeça. É como a letra numa qualquer língua estrangeira de uma música que nos parece fazer sentido sem que percebamos exatamente porquê. Ouvimos e vão-se (re)construindo imagens e memórias. “O amor é”, pois é! Que é, é, mas não sabemos o quê. É fogo que arde sem se ver ou uma outra forma de dizer que se define pela sua simples existência. Também é presente do indicativo. Reconhecemo-lo e, quando o reconhecemos, logo passou. O amor é e basta.

Não sei porque sou do Sporting. Admito que por influência do Zé, um miúdo pouco mais velho que morava em minha casa, pois os pais trabalhavam na Guiné. É possível também que seja por oposição ao meu pai, que era portista, ou por assim conseguir lugar nos dérbis que todos os dias jogávamos na escola, em Viseu. As minhas primeiras memórias sportinguistas remontam a 1974, ao jogo da segunda mão da meia-final da Taça das Taças, contra o Magdeburgo, que perdemos por dois a um e assim não passámos à final, e ao da final da Taça de Portugal, contra o Benfica, que ganhámos por dois a um. São memórias que vão de 24 de abril a 9 de junho. O país mudou entretanto e passou-se do antes ao depois do adeus, enquanto fazia dez anos e era aprovado na prova oral do exame da quarta classe, realizando-a um dia antes do previsto e sem vestir os calções que a minha mãe se tinha esmerado a confecionar para esse cerimonial de papagueado conhecimento.

Lisboa era longe, muito longe. O Estádio de Alvalade e o Sporting eram duas entidades distantes. O sportinguismo era uma paixão ficcionada. Alimentava-se de resultados, relatos, cromos e cadernetas e, uma ou outra vez, de jogos na televisão. Fui a Lisboa pela primeira vez para me inscrever no Instituto Superior de Agronomia, onde estudei. Nos primeiros anos, morei em Algés, em Belém e na Ajuda; nos últimos, na Estrada do Desvio, no Lumiar. Apanhava o 36 da Carris para o Campo Pequeno, onde o 56 me levava à Praça do Calvário, percorrendo o resto do caminho a pé até à Tapada da Ajuda. Passava todos os dias pelo Estádio de Alvalade. Vi o pavilhão e passei a ver metade, quando foi parcialmente demolido no início das obras de prolongamento do Metro de Lisboa para o Campo Grande. Via também o pelado, onde muito raramente a equipa principal treinava. Um dia, por impulso, saí do 36 para ver os jogadores treinar. Lembro-me do Duílio como se estivesse há minha frente. Quem vê um bigode como o dele nunca mais o esquece. Ou porque morava longe ou porque não tinha dinheiro, vi jogar o Sporting intermitentemente. Estive à porta do Estádio de Alvalade para comprar bilhete para o jogo contra o Benfica que ganhámos por sete a um. Hesitei e acabei por não comprar: tinha dinheiro ou para viver na semana seguinte ou para ver o jogo. Arrependo-me, hoje mais do que nesse domingo!

[Ainda não cheguei a meio da minha vida e o texto está razoavelmente chato e comprido. Abreviemos pois.] Em 2017, a minha filha, Ana, foi estudar no segundo semestre para a Universidade de San Andrés, em Buenos Aires. Viajou com antecedência para passar uma temporada no Rio de Janeiro. Quando acabou os exames, continuou as viagens que tinha iniciado durante o semestre na América do Sul e, depois do Chile e do Uruguai, andou também pela Colômbia e pelo Perú. Regressou a meio de Agosto e foi para o Festival de Paredes de Coura, enquanto iniciávamos um período de férias, em Troia. Havia meses que não chalaçávamos como deve ser (expressão a que damos um sentido muito próprio, muito nosso). Combinámos ir buscá-la e ao meu sobrinho João, um fanático portista, a Lisboa para passarem o resto das férias connosco, aproveitando a oportunidade para ir ao Estádio de Alvalade ver o Sporting contra o Estoril, o primeiro jogo da época em casa. A Ana não aprecia futebol e é do Sporting porque tem de ser de alguma coisa, mas era uma excelente oportunidade para revivermos a final da Supertaça de 2002, jogada no Estádio do Bonfim, quando ela e o João eram muito pequenos. 

Ao princípio, era uma festa: “O Mundo Sabe Que”; o Acuña a cruzar para o Gelson Martins empurrar a bola ao segundo poste para o primeiro golo; o Bruno Fernandes a fazer a bola sobrevoar a barreira e a marcar o segundo golo. Depois, bem, depois o jogo encanzinou-se, como era o costume do embaralhado tático que o Jorge Jesus nos servia, e pouco a pouco o difícil tornou-se impossível e o fácil em difícil. O Estoril começou a parecer o Real Madrid e, a meio da segunda parte, reduziu para dois a um. Dentro de campo e no estádio houve mosquitos por cordas. No último minuto, na última jogada, o Estoril marcou o segundo golo. O João petrificou e o olhar da Ana revelava uma profunda tristeza; não por ela, não pelo Sporting, mas por mim. A triste ternura daquele olhar encerrava a razão de ser, o sentido, de uma vida, da minha vida. 

O amor autodefine-se, autorreferencia-se. Não é branco nem preto, não é carne nem peixe, não é homem nem mulher. Não é substantivo. Necessita de objeto mas para a sua simples projeção em nós. É e logo se esvanece, persistindo as suas memórias. O Sporting não é o nosso amor, é as nossas memórias (partilhadas) e, para além de nós, mais ninguém é dono delas, seja este ou aquele dirigente, jogador, treinador ou grupo de adeptos e sócios. Nós somos as nossas memórias e, por isso, o Sporting somos nós, todos e cada um.  

[A história tem um final feliz. O vídeo-árbitro assinalou fora-de-jogo e anulou o golo do Estoril. Fomos jantar ao Mercado do Cais do Sodré. Em seguida, demos uma volta por aqui e por ali até nos depararmos com o Jamaica e o Tokyo, meus lugares de culto e de iniciação. Falei-lhes pela enésima vez dos clássicos, como The Doors, The Rolling Stones ou Lou Reed e Velvet Underground, e dos contemporâneos que se transformaram em clássicos para as gerações seguintes, como Dexys Midnight Runners, U2, REM ou The Smiths. Regressámos, tarde, a Troia. O João e a Ana adormeceram, tranquilos. Coloquei o CD Dark Was The Night para ouvir So Far Around The Bend, dos The Nationals, e a voz melancólica de Matt Berninger cantando: “Nobody knows where you are living/Nobody knows where you are/You're so far around the bend/You're so far around the bend/There is no leaving New York/There is no leaving New York”. Não sei o sentido que esta letra tem para quem a escreveu. Para mim, lembra-me inúmeras viagens com a Ana e uma mensagem dela: “Pai, estou num bar a ouvir So Far Around The Bend!”]" 

 

(*) Rui Monteiro, autor de "A insustentável leveza de Liedson"

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