Saudades de alguém ainda presente
Pedro Azevedo
Javier Marías, um grande vulto da literatura que nunca sentiu complexos em escrever sobre futebol e o seu Real Madrid, dizia que uma das piores coisas da vida era quase nunca se saber quando seria a última vez do que quer que seja. Não saber no momento próprio que aquele era o último romance de Bernhard, ou o último filme de Hitchcock, ou mesmo o último dia da nossa existência, pairando assim aquela sensação de que o que houve não chega, e de que não desfrutámos o que poderíamos se soubessemos que aquela seria a última vez.
Este trecho veio-me à cabeça a propósito da angústia que venho sentindo nesta pré-época de cada vez que vejo jogar Bruno Fernandes. Tenho a sensação de que algo que me entusiasma se encaminha para o fim, e já não consigo desfrutar da mesma forma do prazer que é ver jogar esse enorme craque sem que o meu pensamento seja tolhido pela melancolia de que essa possa ser a última vez. A cada novo golo, assistência ou malabarismo, um peso vai invadindo a minha consciência. No fundo, sinto-me nostálgico por ter saudades de alguém ainda presente, um estado de alma que o Leitor poderá considerar um paradoxo, mas que não deixa de ser real. Nesse transe, como poderei eu festejar entusiasticamente como outrora cada lance de génio do Bruno, já sentindo tanto a sua (futura) ausência? Apre, que este mercado mais parece o purgatório do mundo sportinguista!
PS: Se Bruno sempre foi o pensador, o homem que escreveu as páginas mais belas do Sporting destes últimos dois anos, Wendel é puro instinto. Ele é samba, ele é ritmo, ele é música. Uma lástima Jorge Jesus não ter compreendido que a música, ao contrário da letra, não precisa de tradução para mandarim...