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De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

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Castigo Máximo

12
Mar21

O ciclismo e o Sporting


Pedro Azevedo

O Sporting deve muito da sua implantação popular ao ciclismo. Era um tempo em que o país não tinha grandes infraestruturas, os acessos às principais metrópoles faziam-se com grande dificuldade, não havia televisão e as notícias do Sporting chegavam ocasionalmente via rádio ou através dos jornais. Mas faltava aquela ligação emocional que decorreria de ver as cores verde-e-brancas ao vivo. Com o ciclismo, e nomeadamente com o advento da Volta a Portugal em bicicleta, o Sporting passou a bater à porta de toda a gente, no litoral como no interior. Ainda não havia um movimento migratório para a capital tão pronunciado como nos dias de hoje, pelo que os ciclistas enfrentavam verdadeiros banhos de multidão nas diversas regiões do país. Disso se fez muito do fascínio pelo clube. 

 

O nosso primeiro grande campeão foi Alfredo Trindade. Para apimentar ainda mais a coisa, o Benfica também tinha por esse tempo um ciclista de grande valor (José Maria Nicolau), pelo que Sporting e Benfica viriam a colher um aumento da sua base de adeptos na directa proporcionalidade da rivalidade que se foi semeando entre ambos os ciclistas. Terminados os anos 30, a década seguinte trouxe-nos mais 2 campeões: José Albuquerque, "o Faísca", e Francisco Inácio. A década de 50 foi de seca para o ciclismo leonino, período dominado por dois grandes campeões do norte, Ribeiro da Silva (Académico) e Alves Barbosa (Sangalhos), ambos com presenças relevantes em grandes voltas internacionais (4º lugar de Ribeiro da Silva na Vuelta, 10ª posição de Alves Barbosa no Tour). Chegámos então aos anos 60, o nascimento de um grande campeão. O Sporting começara por ganhar a Volta com João Roque. Este, habituado a treinar na zona saloia, um dia deparou-se com um jovem montado numa pasteleira que ia respondendo ao seu progressivo aumento de ritmo sem mostrar sinais de dificuldade. Intrigado, acabou por o convidar para um treino em Alvalade. Nascia assim a lenda de Joaquim Agostinho, começo tardio para um homem na altura nos seus 25 anos e que não tinha técnica velocipédica. Porém, o que faltava em formação específica compensava em força bruta, tal era a potência em watts que o seu corpo conseguia desenvolver. Com estas características singulares, Agostinho viria a marcar um reinado em Portugal. Logo na sua primeira Volta, em 68, perdeu a vitória final apenas porque a equipa investiu até tarde demais em Leonel Miranda como chefe-de-fila. Resultado: Américo da Silva (Benfica) ganhou e Miranda fez só terceiro. Agostinho terminou em segundo. No ano seguinte viria a vencer, tal aliás como nos 4 anos seguintes. Porém, tanto no primeiro como no último ano seria desclassificado. Não que alguma vez tivesse precisado de doping, tão claro era o seu domínio. A comprová-lo, o 8º lugar na estreia no Tour (69), a melhor classificação até aí de um ciclista português na mítica prova francesa. 1973 viria a marcar a sua despedida da Volta, mas o Sporting muito lhe pode agradecer o fortíssimo crescimento de adeptos em zonas como Loures, Malveira e Torres Vedras, tornando a zona a noroeste de Lisboa um baluarte de Sportinguismo. 

 

Pós-revolução o Sporting terminou e fez regressar a secção de ciclismo em diversas ocasiões. O período mais brilhante terá sido aquele em que Marco Chagas venceu por duas vezes a Volta (85 e 86), uma pequena compensação para a tristeza vivida por todos os Sportinguistas aquando do falecimento de Agostinho, o campeão que voltou e acabou por em circunstâncias trágicas cair de pé, morrendo de amarelo vestido.   

 

Infelizmente, o ciclismo de hoje em Portugal não atrai público como no passado. Existem diversas razões para isso, desde o despovoamento do interior à concorrência de outros eventos desportivos, passando pela ausência de um grande e carismático campeão no pelotão nacional e não-participação dos melhores ciclistas do pelotão internacional nas nossas provas (excepto Volta ao Algarve). Curiosamente, o ciclismo internacional não para de crescer mediaticamente, com a televisão a cumprir um importante papel de divulgação da modalidade e a apresentar-nos imagens apaixonantes das mais importantes etapas de montanha das grandes voltas velocipédicas. No entanto, não deixamos de assistir à festa que as pessoas continuam a fazer na estradas. 

 

Sendo o nível do ciclismo praticado em Portugal relativamente baixo, é natural que algum desinteresse se tenha apoderado junto dos aficcionados. Daí o menor impacto mediático. Ainda assim é justo destacar que Raul Alarcon, do W52/FC Porto, por anomalias registadas no seu passaporte biológico foi desclassificado como vencedor da Volta a Portugal de 2018. Assim, Joni Brandão, do Sporting/CC Tavira, será declarado brevemente vencedor dessa edição, obtendo assim a 10ª vitória individual do ciclismo do Sporting na prova maior do calendário velocipédico nacional. Um triunfo a título póstumo dir-se-á, no que concerne estritamente ao ciclismo do Sporting (que o Joni Brandão felizmente está de boa saúde). 

 

Não existem clubes de primeiro plano no futebol em competições velocipédicas. Há uma boa razão para isso e prende-se com as elevadas verbas que já são necessárias para manter uma equipa no World Tour. Obviamente, os resultados obtidos e a exposição em frente das câmaras traz retorno, mas esse é muito mais facilmente mesurável para uma empresa do que para um clube. Ainda assim, que não seja essa a razão. No meu entendimento o Sporting só deve voltar ao ciclismo caso consiga montar um orçamento apoiado em fortes patrocinadores que nos permita competir no estrangeiro e mostrar a nossa camisola nos ecrãs do Eurosport, canal preferencial do melhor ciclismo que se pratica no mundo. Só assim simultaneamente se dará retorno a quem investe e se cumprirá o desígnio do nosso fundador de ter o clube entre os maiores da Europa Adicionalmente, será necessário que as melhorias que se vêm verificando na formação de ciclistas em Portugal continuem a bom ritmo de forma a podermos ter um recrutamento em qualidade no país e com um preço ainda acessível. Trinta e seis anos após a morte de Agostinho, finalmente apareceu um ciclista especialista em provas de 3 semanas. Chama-se João Almeida e é a grande esperança de todos os amantes do ciclismo em Portugal. Sonhamos vê-lo a competir com os canibais Roglic e Pogacar e a subir aos degraus de pódio nos grandes certames por etapas. A loucura que por cá se viveu aquando da sua participação no Giro d'Itália foi a prova inequívoca de que a paixão pelo ciclismo não morreu, está bem viva. Falta tudo o resto. 

joni brandao.jpg

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