A ilógica olímpica
Pedro Azevedo
Causa estranheza o Sporting ter deixado de contabilizar no seu palmarés a vitória obtida na Taça dos Campeões Europeus de Goalball. Tal omissão é visível no site, na SportingTV e na inscrição alusiva ao número de títulos europeus colocada na bancada norte do estádio.
As gestões do clube têm sido o que sabemos e a última até nos deixou a todos particularmente traumatizados, mas se há marca de que nos poderemos orgulhar é a do seu legado do Gabinete Paralímpico e o que significa em termos de consciencialização e redução do preconceito com deficientes e sua inclusão social. Integram-no atletas de alto rendimento que mostram à evidência que, mesmo com algumas diferenças ou adaptações, todos somos iguais.
É, por isso, incompreensível a omissão do título europeu de Goalball. Durante muito tempo não houve uma informação oficial sobre o facto, mas recentemente Miguel Afonso, membro do Conselho Directivo com o pelouro das modalidades, forneceu explicações em entrevista ao jornal do clube. Nesse contexto, aludiu à separação entre a logica olímpica e a paralímpica para excluir o Goalball do número global de títulos europeus, não deixando de referir que para o Sporting todas as modalidades (desporto adaptado incluído) têm a mesma relevância e grandeza.
Ora, se todas as modalidades significam o mesmo para o clube, estranha-se que no estádio, na SportingTV ou no site não seja dado o merecido destaque à vitória paralímpica. Além disso, esta segmentação incorre num erro crasso, pois o corta-mato não é integrante do programa olímpico do atletismo e o hóquei em patins não é sequer uma modalidade olímpica, embora tenha aparecido como demonstração nos Jogos de Barcelona. Assim sendo, e adopando a lógica de Miguel Afonso, o Sporting teria apenas 7 títulos europeus, a que se haveriam de adicionar 1 no desporto adaptado e 22 em modalidades não-olímpicas.
Podendo continuar a reescrever-se a história, poderia passar-se também a só se contabilizar os títulos de campeão europeu, deixando as Taças das Taças ou as equivalentes à UEFA, noutras modalidades (CERS, Challenge), de fora. Desta forma, restar-nos-iam 21 títulos europeus (16 no corta-mato, 3 no atletismo de pista, 1 no judo e 1 no hóquei), para além do Goalball, sendo que apenas 4 seriam olímpicos.
A sensação que tenho é que tudo isto é uma forma subtil de discriminação, algo que subverte a lógica de criação do Gabinete Paralímpico. Como se este fosse um filho de um Deus menor dentro do clube. Nunca saberemos, mas seguindo a mesma lógica de discriminação, quiçá há alguns anos atrás subtrar-se-iam os 3 títulos conquistados pelas Senhoras. Que teriam "a mesma relevância e grandeza", mas figurariam em lado nenhum...
Deixo, por isso, aqui o meu apelo à Direcção de Frederico Varandas e às pessoas de bom senso que sei que a compõem para que terminem imediatamente com este triste sinal de menoridade intelectual que o clube está a dar ao país. O Sporting sempre foi um exemplo de como o desporto pode lutar contra o preconceito e ser inclusivo, mesmo no tempo em que as leis do país discriminavam o género e socialmente se ponderava diferentemente a raça.