Pode ser lido como uma brisa de ar fresco na ambiente poluído do futebol português, ou o amor como mote em tempos de cólera, a verdade é que em dia de São Valentim, e com vários casais de namorados nas bancadas, o Sporting recebeu o Villareal em Alvalade.
O resultado não foi bom e julgo que é reflexo de uma falta de convicção generalizada que se nota no clube a todos os níveis, especialmente no que concerne à política desportiva, envolvendo Direcção, treinador, jogadores e adeptos. Mas ser destrutivo, ainda mais em cima de uma derrota, não é algo que me esteja no sangue, pelo que vou antes falar daquilo que me perpassou a alma enquanto via o jogo.
Vivemos tempos de cólera. Os sportinguistas não andam contentes, procuram compensações. Os acontecimentos da última Primavera/Verão, as mudanças sucessivas de liderança a nível directivo e técnico, a sistemática tergiversão na forma como se vê a Formação, a ilusão de umas noites de Outono que deu lugar ao Inverno do nosso descontentamento, a distância para os primeiros classificados no campeonato nacional, tudo isso vem deixando os sportinguistas à beira de um ataque de nervos. Adicionalmente, creio que se perdeu o "timing" de transformar uma crise numa oportunidade e de se reconstruir o edifício do futebol. Em vez disso, na janela de Inverno chegaram 10 jogadores, só um deles regressado de um empréstimo, a mostrar à saciedade que a mudança deixou tudo na mesma. Mas esta derrota em dia de São Valentim tem de se revestir de um carácter alegórico para todos nós. Porque o nosso amor pelo clube tem de vencer. Não é Varandas, Keizer, ou mesmo os capitães de equipa que nos fazem ser do Sporting e andamos há tempo de mais a confundir as coisas. Eu não misturo quem conjunturalmente nos representa com a perenidade que desejo para o clube. No passado recente como hoje. Por isso, e se for caso disso apesar de A, B ou C, eu estarei sempre com o clube e erguerei com orgulho o facho que partilho com os meus filhos e que um dia eles comungarão com os seus. E espero (e desejo) que todos os que mais directamente têm responsabilidades no clube o façam também. Que ponham sempre o clube em primeiro lugar, à frente das suas ambições pessoais e acima das vaidades de cada um. E lutarei até que o meu clube consiga impor uma Cultura corporativa que vinque os seus valores e não se torne um constante receptáculo de maus costumes, más práticas e péssima educação trazidos de fora para dentro. Para isso, é necessário que se saiba o que se quer e como fazê-lo. E, caso não se saiba, recorrer a quem possa ajudar. Adicionalmente, urge saber transmitir aos associados o que se pretende fazer, de que forma e, o mais importante, por que é que esse tem de ser o caminho, este último o elo emocional, "a causa" que liga as pessoas à instituição. Sem isto...
É preciso reflectir. E o tempo é agora. O clube continua herméticamente fechado durante os mandatos presidenciais. As portas entreabrem-se em época eleitoral, na caça ao voto, para logo se semicerrarem até se fecharem definitivamente. Não é bom conselheiro pensarmos que tudo sabemos. Há que ser humilde e saber ouvir. Para um adepto, de que adiantará antecipar um acidente se não o conseguir evitar? Isso só se traduzirá em frustração e desconsolo, e com isso mais gente irá abandonar o barco, mais tempo de cicatrização de feridas vai ser perdido. O tempo no Sporting está sempre contra quem lá está. É assim em clube que não ganha. Por isso é que digo que se perdeu uma oportunidade de testar algo diferente. De que vale gastarmos dinheiro em pesquisa e desenvolvimento, se depois não testarmos um medicamento (e mais tarde o vendermos)? Pois é exactamente isso que está a acontecer à nossa Formação. Que vai definhando, desmotivando, quando todos sabemos que é a única forma de sermos sustentáveis económicamente, logo financeiramente também. Simplesmente, o populismo e a fuga para a frente são mais fortes e acabamos por preferir morrer sem glória do que ousar vencer de outra forma e, na pior das hipóteses, cair de pé. Por isso digo que falta convicção. Há anos! E também bom senso, como o atesta a polémica da exclusão do título europeu de Goalball do nosso palmarés. Provavelmente, um acto perpetrado por quem menorizou a modalidade, quando na verdade o resultado da sua acção (e posteriores explicações), dir-se-ia, potencialmente discriminatória enxovalha o clube. Tudo feito num jeito meio envergonhado, sem convicção e que, no caso, se acabou por traduzir numa falta de respeito pelo esforço dos atletas em causa, pelo desporto adaptado em geral e pelos portadores de deficiência. Em contra-ciclo com a sociedade e o seu movimento em favor da integração e equiparação.
O meu desejo e maior sonho é que esta derrota traga resultados positivos no futuro. Que dela se tirem ilações, determinados procedimentos se corrijam e outra mobilização seja requerida. Há gente nesta Direcção com boas ideias e muita capacidade profissional. Para que consigam desenvolver as suas competências dentro do Mundo Sporting é fundamental que a política desportiva entre nos eixos. Igualmente, a Comunicação deve aproximar os sócios, não afastá-los por via do desconhecimento do que se passa. Há aqui demasiados equívocos e paradoxos na nossa actuação perante os sócios e adeptos do clube, que são também o alvo preferencial do consumo dos nossos produtos e serviços.
Quanto ao jogo, vou ser curto: um futebol sem chama, onde não se viu ligação entre os jogadores nem o típico 1/2 toques do período inicial de Keizer. Creio que tal resultou da falta de condição física de vários jogadores e reflectiu-se tanto na menor disponibilidade nos movimentos de aproximação à bola como na pior qualidade do passe. Assim, em 90 minutos, tivemos apenas duas oportunidades de golo: um remate de Dost após boa jogada individual de Raphinha e um tiro de Coates ao poste na sequência de um canto marcado por Bruno Fernandes. Muito pouco. Admito, como atenuante, que a condição física seja uma condicionante ao futebol que Keizer quer implementar, mas também vejo o treinador um pouco à deriva. Houve uma tentativa de mexer nos conceitos de jogo que apresentou inicialmente, em função de uma suposta melhoria da transição defensiva, que penso não ter corrido bem. O nosso jogo é reflexo dessa encruzilhada em que Keizer se meteu. Ele próprio hoje é diferente do Keizer original, mostrando, também ele, a tal falta de convicção.
De igual modo, os jogadores parecem hoje menos convictos da qualidade dos princípios de jogo. Como se simultaneamente quisessem acelerar e travar. O jogo aventureiro transformou-se num jogo de medo e as recentes declarações de Bruno Fernandes, meio codificadas, de que a equipa se deixou de preocupar com ela própria para agir em função de outrém, deixou-me a pensar se os jogadores também não sentiram a mudança no paradigma de jogo.
Vou terminar, pedindo desculpa a todos os Leitores por hoje a habitual ironia ou mordacidade não se ter revelado. É que sendo o futebol a coisa mais importante das coisas verdadeiramente não importantes, há momentos que nos tiram a vontade de brincar. (O humor e a sátira hão-de voltar, fica a promessa.)
Tenor "Tudo ao molho...": Seba Coates
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