Tudo ao molho e fé em Deus - Ter ou não ter
Pedro Azevedo
Esta noite o Sporting teve dois terços de posse de bola. No primeiro terço clamaram-se os Mistérios Gozosos e rezaram-se 50 Avé Marias, no segundo invocaram-se os Mistérios Dolorosos e oraram-se outras 50 Avé Marias. Para completar o Rosário só faltou um terço, o correspondente aos Mistérios Gloriosos...
Para o Sporting, ter a bola é o contrário de não a ter, filosofia herdada dessa grande educadora das massas que dá pelo nome de Lili Caneças. É um "statement"! Não existe propriamente uma ideia sobre onde ter a bola e como levá-la até lá, apenas a sensação de bem-estar de a ter. Deste modo dificilmente poderíamos derrotar alguém. Assim, a ideia é valorizar itens que inacreditavelmente ainda não são bem aceites pela comunidade futebolística. Somos uns visionários! Como não podemos ganhar ao adversário, pelo menos goleamo-lo nas estatísticas. Por exemplo, hoje o Coates e o Ilori devem ter batido todos os recordes de passes executados num jogo de futebol. E com uma percentagem de acerto muito perto dos 100%. Uma grande vitória! Eu creio que entendo a ideia: enquanto os nossos centrais vão passando a bola um ao outro num metro quadrado de terreno pode ser que os adversários adormeçam e nós possamos desferir um golpe mortal. (Se calhar é por isso que o consumo de cafeína na nossa Liga costuma ser tão elevado.) Simultaneamente, em casa e nas bancadas, os adeptos também fecham os olhos, mas para pedir a Nª Senhora que aconteça qualquer coisa. E às vezes até acontece, nomeadamente quando o Bolasie remata e a bola entra às três tabelas na baliza, ou quando uns austríacos falham um conjunto de oportunidades num só jogo que dava para vencer a Liga Europa. Também pode ser que tanto foco na posse apenas signifique que queremos levar a bola para casa. Na escola, quando jogávamos ao berlinde, havia um menino que trazia sempre um abafador. O seu objectivo não era jogar e ganhar ao berlinde, preencher as 3 covinhas e tal. Não, ele apenas queria levar para casa todos os berlindes que pudesse...
Pouco mais há a dizer. Goleámos no jogo da posse de bola e no dos cantos, este último com um saboroso 7-1 a fazer lembrar tempos de glória. Também ganhámos em ataques. Uma maravilha! Já em remates enquadrados à baliza, empatámos. Se calhar, podíamos começar a análise por aí, não fora isso não interessar para nada. Mesmo que para além de Bruno Fernandes não haja ninguém que acerte naquela moldura com 7,32mx2,44m. Para dizer a verdade, geralmente não há sequer quem tente, pese embora desta vez Miguel Luís ter ousado por duas vezes (Vietto limitou-se a assistir o guarda-redes). Mas, se um dia nos voltarmos a preocupar com uma visão não pós-modernista de um jogo de futebol, então talvez desse jeito haver médios com velocidade, recepção, habilidade e qualidade de passe que permitissem sair com bola rapidamente da zona de pressão. Como o Matheus Nunes, por exemplo, aquele carioca que treina com a equipa principal apenas para poupar os relvados atribuídos às equipas jovens em Alcochete. Parece que estes têm buracos e buracos é coisa com que não pactuamos no futebol do Sporting. Nem com buracos nem com jovens. Por isso têm de ir procurar a sua sorte noutros lados. Como bem fez o Bruno Wilson, produto da nossa Academia. "Veni, vidi, vici" exibia ele tatuado abaixo da nuca. Como Júlio César após a Batalha de Zela (rima com Tondela), uma mensagem para os senadores (de Alvalade) sobre o poder da nossa Formação. Amén!
Tenor "Tudo ao molho...": Não aplicável