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Castigo Máximo

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

Castigo Máximo

22
Jul20

Tudo ao molho e fé em Deus

O Jovane não decidiu (mal)


Pedro Azevedo

Entediado com o tipo de jogo sensaborão que o Lito Vidigal sempre proporciona, entretive-me a ler um estudo da Katherine Berg, professora do Departamento de Terapia Física da Universidade de Toronto. A Katherine é especialista em geriatria e elaborou uma escala. A escala de equilíbrio de Berg é um teste clínico que visa determinar o equilíbrio estático e dinâmico de um indivíduo. Compreende 14 tarefas de equilíbrio simples, cada uma pontuada de 0 a 4. Apresento-vos as conclusões: se o resultado final for entre 41 e 56, considera-se que o indivíduo é independente no que respeita à mobilidade; caso oscile entre 21 e 40, então o indivíduo necessitará de assistência para andar; na eventualidade de ser igual ou menor que 20, determina-se que o indivíduo é um Semedo ou um Makaridze.

 

Eis como lendo um livro se pode aprender sobre o que se passa num relvado de futebol. Pensei logo no Chico Geraldes e que isso também funcionaria bem com ele. Bem, talvez com menos Ensaio sobre a Cegueira e mais Ensaio sobre a Lucidez a coisa vá lá. Ou mesmo - porque não? - , ensaiar o remate. (Chuta rapaz, se não de nada adianta puxar aqui por ti.)

 

O Sporting tinha hoje um primeiro match-point para garantir o 3º lugar que dá acesso directo à fase de grupos da Liga Europa. Mas o que Artur Jorge (pai) e companhia deram, Artur Jorge (filho) e companhia tiraram, e lá iremos para a última jornada a precisar de pontuar na Luz não vá o diabo tecê-las na Pedreira e o Porto sair de lá derrotado. O Vitória, que é sadino mas não e sádico, é que não desperdiçou a oportunidade de melhorar a sua situação (saiu da "linha de água") e agora basta-lhe vencer o Codecity, a SAD que usa o nome d' Os Belenenses, para permanecer na Primeira Liga. Quanto ao Portimonense, que também é uma SAD, até uma vitória sobre a SAD que ameaça não comparecer em Portimão poderá não lhe valer. Atenção porém que estes últimos são Aves e de rapina, como tal até a Taça de Portugal ganha contra nós voou. Como diria um amigo meu inglês, a história das SAD em Portugal é "sad". A da Liga também. Muito.

 

O jogo não foi bom nem mau (antes pelo contrário), o Pentágono do Ruben Amorim não é bom nem mau (antes pelo contrário) e os jogadores que enquadram os jovens não são bons nem maus (antes pelo contrário). Já este autor que Vos escreve também não deve ser bom para alguns situacionistas ou cartilheiros (hoje há horas extraordinárias aí no escritório?) quando escreve o que vê antes dos resultados se desvanecerem, nem mau quando se cala hoje perante evidências que já não pode contrariar (antes pelo contrário). São muitos anos a virar frangos (lembram-se do Katzirz?). Assim, sem mais assunto, após esta longa elegia ao Gabriel Alves, saúdo um novo equipamento que não é bom nem mau (antes pelo contrário) e os 200 jogos do Coates, que é um bom profissional. Ah, quase me esquecia: o Nuno Almeida não é bom nem mau (antes pelo contrário). O Xistra idém, mas pelo menos já está reformado. Pelo contrário, quem hoje deixou saudades foi o Jovane. Muitos tiveram pena que não jogasse, especialmente aqueles que embirram com ele e não perdem uma oportunidade de dizer que decide mal. Pois bem, hoje não decidiu de todo.

 

O mal disto tudo (da formação dos plantéis) é a contabilidade das SAD. Então não é que uma venda entra toda direitinha e uma compra só releva pela amortização do número de anos do contrato? Assim, não há austeridade ou bom senso (e bom Scouting) que impere, ou défice estrutural que assuste uma Demonstração de Resultados, basta vender caro. Depois, compra-se igualmente caro e divide-se por muitos anos de contrato. Eis a essência desse dinheiro cripto ou encriptado para a maioria dos adeptos. Fácil, não é? Quarenta e cinco milhões para aqui, cento e vinte milhões para ali, consoante o escalão de hard-core. Difícil mesmo é haver um Bruno Fernandes com um rendimento desportivo superlativo em qualquer palco, que vale cada cêntimo que se pague por ele. Mesmo que isso apenas represente uma perna do Felix. Assim vai o futebol (português e não só). 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Marcos Acuña

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20
Jul20

Do mal o menos


Pedro Azevedo

Bem sei, esta temporada ficará aquém dos pergaminhos do clube. Porém, com a derrota do Braga hoje em Tondela, bastará ao Sporting uma vitória na recepção ao Vitória Futebol Clube (de Setúbal) para automaticamente assegurar o 3º lugar no campeonato. Dir-me-ão que terceiro ou quarto é igual. Não é, na medida em que o último lugar no pódio garante a passagem imediata à fase de grupos da Liga Europa e mais algum dinheiro (embora nada que se compare à Champions), evitando assim o Sporting disputar duas fases a eliminar e podendo começar a época mais tarde. Uma boa notícia, portanto. (Mas é preciso ganhar amanhã.)

16
Jul20

Tudo ao molho e fé em Deus

Pentágono não evitou festa dos Aliados


Pedro Azevedo

O Sporting foi derrotado no Dragão e a tentação de o justificar devido à utilização de muitos miúdos da nossa Formação será certamente grande. Todavia, do meu ponto de vista tal não só será injusto como também perigoso. Injusto, porque apesar do desaire Matheus Nunes iluminou a noite do Porto com uma exibição onde mostrou categoria e personalidade perante os dois armários que Sérgio Conceição lhe colocou pela frente e Nuno Mendes voltou a deixar água na boca em relação ao seu futuro. Perigoso, na medida em que poderá transmitir a ideia que é só deixar crescer os jovens e acrescentar-lhes experiência para sermos felizes quando na verdade precisamos essencialmente não só de tempo como também de jogadores consistentes e de qualidade a enquadrar a nossa Formação, o que implicará uma abordagem ao mercado completamente diferente daquela que tem vindo a ser seguida até aqui tanto nas compras como nas vendas.

 

Trago à colação o enquadramento porque ao longo de ano e meio perdemos Nani, Raphinha, Bas Dost, Bruno Fernandes e Mathieu, qualidade que foi substituída por quantidade que na sua esmagadora maioria não se impôs. Ontem, por exemplo, Sporar foi de uma inoperância total e até defensivamente falhou ao não ter atacado a bola convenientemente no lance do primeiro golo. Na lateral/ala direita, Ristovski é um brioso profissional que apesar das suas limitações técnicas ainda oferece mais garantias que duas contratações (Rosier e Camacho) que juntas custaram muito dinheiro (10,9 milhões de euros mais o passe de Mama Baldé). Ilori, Neto, Borja, Eduardo, Doumbia são curtos para o Sporting e Vietto tem qualidade mas é estatisticamente pouco relevante, não justificando na plenitude o investimento feito na sua contratação e o seu elevado custo salarial para o clube. De Fernando, Bolasie e Jesé nem vale a pena falar e Luiz Phellype está há muito tempo lesionado. 

 

Assim sendo, apenas Matheus Nunes e Gonzalo Plata, dois jovens, parecem mostrar qualidade suficiente que justifique a aposta que neles foi feita aquando da sua contratação, o que é manifestamente curto para um investimento de 50 milhões de euros e custos com pessoal consideráveis. Acresce que dos que já cá estavam só Acuña é de primeiro plano, pese embora não seja um jogador consensual para quem não entende que muitas vezes as nossas principais qualidades estão perto de ser os nossos principais defeitos. Mais inteligente que a média, Bruno Fernandes resumiu tudo quando alertou que ao tentar corrigir-se os defeitos do argentino poder-se-ia correr o risco de afectar as suas melhores qualidades. Em relação aos outros, Battaglia demora a adquirir a forma anterior à lesão e é uma incógnita para o futuro, Wendel alterna jogos muito bons com outros em que adopta o modo Zé Carioca e mais parece um holograma, Ristovski é limitado ofensivamente e Coates, embora menos exposto pelo sistema de 3 centrais que lhe exige essencialmente que tenha atenção às dobras, tem falta de velocidade, pouca saída de bola e por vezes desconcentra-se na marcação. Sobra o renascido Jovane, um valor seguro nem sempre bem entendido. Mas tem apenas 22 anos e não se lhe pode colocar um peso excessivo em cima dos ombros. Atlas já houve um, chama-se Bruno Fernandes e tem imensa categoria, mas nem ele conseguiu evitar que a época fosse um flop. 

 

Deste modo, é importante perceber que há muitos jogadores no plantel com uma relação custo/benefício deficitária que deveríamos alienar ou emprestar, a fim de se poder libertar cash-flow para a realização de alguns investimentos efectivamente produtivos. Comprar por comprar será apenas mais do mesmo, pelo que os resultados dessa política estarão sempre em linha com o que foi a realidade desta época. Comprar em quantidade, sempre alegando não haver dinheiro, só por si já constituiria um paradoxo, pois essas aquisições acabam por se revelar muito mais onerosas do que a simples contratação de 3 jogadores de qualidade indiscutível, não só pelo investimento inicial como também pelo custo total que o clube acaba por pagar no somatório dos anos de contrato de cada jogador. Ora, se do ponto de vista financeiro o resultado dessa política é desastroso, o impacto desportivo não é melhor, o que numa segunda derivada acaba por comprometer ainda mais as nossas finanças devido à não qualificação para a Champions. 

 

O jogo? Uma primeira parte muito equilibrada em que as equipas se encaixaram perfeitamente uma na outra, bloqueando muito o jogo a meio campo, com muitas faltas à mistura. O primeiro golo do Porto diminuiu a ansiedade dos dragões e facilitou-lhes a vida. Tudo se resumiu à concentração. Um erro individual ofereceu o primeiro golo ao Porto e uma sucessão de erros individuais resultou no segundo. Se Sporar não atacou devidamente a sua zona de acção no canto (do cisne), no segundo golo Wendel alheou-se do lance, Geraldes deixou-se ir no engodo de uma disputa de bola onde Matheus já estava envolvido e deu todo o tempo do mundo a um portista sem pressão para fazer a assistência e Coates só olhou para a bola e esqueceu-se de Marega nas suas costas. 

 

Se perdemos devidos a erros individuais, não foi certamente devido ao sistema do pentágono que fomos menos competentes defensivamente. Porém, do ponto de vista ofensivo foram visíveis as dificuldades de desdobramento da equipa, demasiadas vezes apenas com um jogador (ou 2) nas imediações da área adversária quando em posse ou transição. Pouca chegada para um clube grande e a requerer que futuramente tanto o lateral/ala do lado oposto da bola como um segundo médio apareçam muito mais vezes nos envolvimento atacantes. Disso dependerá o sucesso ou insucesso futuro deste sistema a nível de resultados e também em termos de uma qualidade exibicional que entusiasme sócios e adeptos a comparecerem em massa no José Alvalade e nos estádios deste país assim que as condições sanitárias o permitam. Compreenda-se porém que Ruben Amorim leva muito pouco tempo de trabalho com esta equipa e que há rotinas que demoram até que estejam totalmente interiorizadas. Enfim, há uma base, é preciso é que a direcção do clube acrescente alguma coisa ao processo, não permitindo que se criem falsas expectativas em relação a 2020/21 que justifiquem mais incursões desmesuradas no mercado.  Repito o que tenho vindo a dizer em vários momentos: se queremos estar a lutar pelo título daqui a 2 anos, então precisamos de dar um passo importante na próxima época, e esse passa por apenas 3 contratações que acrescentem qualidade indiscutível à equipa. Esse é o caminho, o resto serão atalhos para o abismo. E não me digam que não há dinheiro, não quando se investe anteriormente cerca de 60 milhões em jogadores (15) e treinadores (mais ordenados) e se pagam indemnizações milionárias por apostas mal sucedidas. Tem de haver dinheiro, eliminem é as redundâncias que fazem com que tenhamos custos na SAD próximos dos 110 milhões de euros anuais e um plantel que custa 70 milhões, valores que necessitam de um corte urgente de aproximadamente 35%, pois são despesas que criam estrangulamento na tesouraria e não se justificam de todo quando temos uma boa base da Formação. Mas sobre isso pouco se ouve.

 

Parabéns ao F.C. Porto pelo título de campeão nacional!

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Nunes (elevar o nível do seu jogo num palco grande não é para todos, especialmente quando se trata de um jovem jogador)

 

P.S. Peço desculpa, mas hoje a minha costela irónica ressentiu-se da derrota.

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11
Jul20

Tudo ao molho e fé em Deus

Jovane resolve!


Pedro Azevedo

Em "Repeated games with incomplete information", os matemáticos Robert Aumann, Michael Maschler e Richard Stearns, que contratados por uma agência governamental americana elaboraram estudos e estabeleceram padrões úteis nas negociações sobre desarmamento durante a Guerra Fria, explicam que quando as pessoas interagem, elas usualmente já o fizeram no passado e é esperado que o voltem a fazer no futuro. Este elemento de continuidade é estudado na Teoria dos Jogos Repetidos e visa prever fenómenos como cooperação, altruísmo, secretismo, confiança, castigo ou vingança. O ponto principal do livro é que há informação vital que pode ser retirada da acção de um jogador, sendo certo no entanto que por vezes o jogador pode esquivar-se a tomar certas acções de forma a evitar essa revelação (exemplo típico do póquer). Sendo altamente provável que Aumann, Maschler e Stearns não conheçam o futebol português, desconhecerão por certo que as conclusões do seu trabalho se aplicariam na perfeição à arbitragem portuguesa a ao Coates ("os jogadores"). Ao uruguaio, na medida em que erroneamente interpretou o sinal de que nada lhe serviria cair ao chão após um agarrão (Moreira de Cónegos) e no jogo de ontem libertou-se de quem o agarrava e cabeceou a bola para logo ser sancionado pelo árbitro, sendo assim sempre prejudicado independentemente do comportamento adoptado. Aos árbitros, porque transmitem informação contraditória e enganadora, ora não punindo um agarrão ao Coates e sua posterior queda na grande área do Moreirense, ora punindo o Coates por se ter libertado de um agarrão na grande área do Santa Clara. Tudo isto traz à colação a atitude tomada por Lorde Rothschild na Bolsa de Londres, em que, antecipadamente sabendo por um dos seus informadores da vitória do Duque de Wellington na Batalha de Waterloo, mandou o seu homem de confiança vender acções (criando a percepção nos especuladores de que os ingleses haviam perdido a batalha e provocando o pânico de venda no mercado) enquanto simultaneamente encomendava a múltiplas pessoas cuja ligação a si era por todos desconhecida que comprassem em baixa o máximo possível de títulos accionistas. Conclusão: em Portugal há sempre um vasto conjunto de agentes que contribuem para que os jogos do Sporting se repitam sempre com informação incompleta, aquilo a que os comentadores do fenómeno depois traduzem por critérios. Por isso, se calhar a solução é o Coates posicionar-se à entrada da área, fingindo que vai participar no lance e concentrando em si as atenções, para posteriormente alhear-se enquanto outros colegas atacam a bola. É que não temos Lorde Rothschild, mas fomos fundados por um visconde...

 

A primeira parte foi sofrível, de um futebol quase sem balizas. O Sporting devia ter marcado por Doumbia - o costa-marfinense quase era herói, ele que lateralizou e passou a bola para trás 99% do tempo - naquele lance em que Coates esteve envolvido, e o Sporar voltou a falhar escandalosamente um golo cantado pelo Jovane, à semelhança do já ocorrido com o Paços. O Santa Clara pouco fez também, mas quase se adiantou no marcador mesmo no fim da primeira parte. O intervalo chegou sem mais nada a registar. No regresso, tomámos o controlo das operações. Por duas ou três vezes o Quaresma isolou o Ristovski na direita e por duas ou três vezes o macedónio cruzou mal. Até que acertou, mas o excesso de altruísmo do Nuno Mendes acabaria por resultar em falta de eficácia. O Jovane lá ia criando os envolvimentos dentro da área, mas na hora da verdade sempre aparecia um pé açoriano a desviar a bola. Eis então que o Wendel faz um passe longo para as costas da defesa açoriana, a cair sobre a quina da pequena área. A bola parecia perdida, mas o Jovane, mesmo apertado, ataca-a e com o pé esquerdo põe a bola junto ao ângulo superior da baliza. Um golão! 

 

O Jovane marcou assim o seu quinto golo pós-desconfinamento. Dos seus pés saiu ainda uma assistência para um golo em Guimarães e o toque subtil de calcanhar de onde resultou uma penalidade e golo contra o Tondela, num total de 7 acções preponderantes para os 11 golos marcados pelo Sporting (63,6% de participação nos golos) neste período. Isto para além de uma série de passes para golo ingloriamente desperdiçados pelos seus colegas (só entre Vietto e Sporar já se perderam meia-dúzia). Por isso, quando as bancadas do José Alvalade puderem voltar a estar repletas de público, é possível que o espírito de Liedson se possa reviver num cartaz que diga "Jovane resolve!" (repeated games). Essa seria a única informação (completa) em que poderíamos confiar.

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jovane Cabral. Menções honrosas para Wendel, Quaresma, Nuno Mendes e Acuña. O argentino ajudou a ligar o jogo desde trás, experimentando mais uma posição no onze, mas acabaria uma vez mais por ser vítima da sua própria impetuosidade e vai ficar fora do jogo no Dragão (para um jogador do Sporting "à bica" do quinto amarelo o que parece sempre é, e essa é a informação vital que se pode retirar da acção de outros "jogadores").

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07
Jul20

Tudo ao molho e fé em Deus

O Restaurador Olex e a dura lex, sed lex


Pedro Azevedo

Jogo na segunda-feira às 9 da noite, em Moreira as bancadas estão vazias mas há uma varanda desconfinada sobranceira ao estádio onde o distanciamento social é uma ilusão. Sem praia, também o Portugal rural a mandar às couves as recomendações da Drª Graça Freitas. No relvado a coisa parece um concerto dos Stomp em que tudo serve para martelar. Não há canelas, tornozelos, tendões de aquiles ou dedos dos pés que resistam. Dois canhotos, Abdu Conté e Borja, são os líderes metaleiros. Só os guarda-redes parecem a salvo. Mas eis que o treinador do Moreirense entra na festa:

- Pasinato, ó Pasinato! - , grita para o relvado o Ricardo Soares.

- Sim, mister?

- Atira-te para o chão! Para o chão!

- E dói-me o quê?

- O gémeo. (Ricardo Soares caricatamente contorce-se e simula um boneco desarticulado por uma pretensa força que incide sobre a barriga da sua perna.)

- Ah, ok!

Paragem interminável do jogo de forma a que Steven Vitória possa aquecer à vontade e o treinador engendrar um novo sistema táctico que resista à inferioridade numérica. Tudo à vista de toda a gente, sem vergonha, na segurança da sua impunidade. Bem podia ser uma Farsa de Aristófanes, mas não, é o futebol português em todo o seu "esplendor" (caro Fernando Gomes, esta a ver porque o produto não é exportável?). O mesmo futebolzinho onde depois do martelo vem a foice e o Jovane é cortado rente como a seara dentro da área moreirense perante o olhar indiferente de Tiago Martins e o silêncio conivente de Jorge Sousa, o VAR de plantão. Tudo paradigmas da ideologia "comunista" que ontem grassou em Moreira, acérrimamente defensora da igualdade e da co-propriedade (dos pontos).

 

O jogo? Em terra de cónegos é possível que o "Diácono Remédios", habitual zelador dos costumes das tácticas neste blogue, se venha politicamente manifestar, mas o estimado senhor que tenha paciência pois a verdade é que ontem foi de novo visível que, com 2 médios jogando muito perto um do outro, o fosso para os 2 interiores que jogam por detrás do ponta de lança é enorme, o que leva sistematicamente a circularmos a bola em "U", procurando assim através da Ala dos Namorados flanquear o opositor. A alternativa é o recúo dos interiores, ficando então Sporar numa ilha, longe de tudo e de todos. É curto, embora pontualmente a inspiração de um jogador possa resolver. Ultimamente esse jogador vinha sendo o Jovane, isto é, o Jovane que não é loiro nem branco de carapinha e é natural (a marcar golos) como o Restaurador Olex. Mas esse não esteve ontem em Moreira de Cónegos. O Max também poderia não ter estado, visto que não foi chamado a realizar uma defesa. Pelo menos a remates de jogadores do Moreirense...

 

Desta vez jogaram menos miúdos. Com isso vieram à superfície algumas limitações no plantel. Atente-se no Neto. O Neto é bom rapaz, respeitador do clube e da sua história, mas precisa compreender que não tem de ler toda a enciclopédia luso-brasileira antes de fazer um passe. Outro mestre na arte de engonhar na hora da saída de bola é o Borja. O colombiano, naquele seu jeito vai-que-não-vai com passes laterais dentro da área à mistura, provoca calafrios constantes ao bom do adepto. Ontem safou-se de boa após entrada imprudente e pouco católica sobre um cónego. Depois há o Ristovski, sempre a cruzar contra o primeiro boneco que lhe apareça pela frente. A coisa só melhorou quando o Acuña foi improvisado como central pela esquerda, o Nuno Mendes alargou na ala e estendeu-se ao comprido de forma literal e não idiomática e o Wendel entrou e começou a transportar jogo para a frente. 

 

Com os descontos, o Sporting esteve cerca de 45 minutos em superioridade numérica no relvado. Sensivelmente meia-parte em que a bola circulou lenta, lentamente como quem clama por praia em jogos com trinta graus à sombra. O Sporting não tinha sido melhor que o Moreirense na primeira parte e não soube traduzir o domínio no segundo tempo em oportunidades de golo. Talvez se o Geraldes não se tivesse lesionado as coisas pudessem ter sido diferentes, na medida em que houve vários momentos do jogo em que um passe de ruptura e uma superior visão de jogo teriam feito a diferença. De outro modo ficámos com pouco de que nos queixar. Ou ficaríamos, pois tempo ainda houve para o momento de dramatismo em que o Tiago Martins foi ver umas imagens e concluiu que o agarrão ao Coates fazia parte das leis do jogo ("dura lex, sed lex"). Mas quem nada propôs e nenhuma medida se lhe conhece até hoje para alterar este paradigma do futebol português também pouca moral tem para reclamar. Afinal, de que serve esgrimir argumentos contra os moinhos como D. Quixote de segunda-feira enquanto os outros enchem a pança? (A UEFA e a FIFA é que parecem não ter dúvidas sobre a sua qualidade, pelo menos a atestar pela ausência nos relvados dos árbitros portugueses nas ultimas competições internacionais de seleções organizadas por esses dois organismos que superintendem o futebol.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Wendel. Menções honrosas para Coates e Nuno Mendes. 

 

P.S. Uma coisa é termos a consciência da grandeza histórica do clube, daquilo que somos, o que é Ser Sporting. Outra coisa, bem diferente, é os adeptos embandeirarem em arco e, perante o silêncio conivente de uma Direcção que vê nessa ilusão uma forma de sobrevivência, começarem a acalentar o sonho do título em 2020/21. Isso só trará desilusão e consequente instabilidade social ao clube, pelo que é importante haver desde já um discurso de verdade por parte de quem é competente para o efeito. É preciso perceber que há que ter paciência com os miúdos e dar-lhes margem para errarem e crescerem. Simultaneamente, não havendo dinheiro para satisfazer todas as posições em défice, há que definir prioridades de mercado e procurar apenas qualidade. Ao mesmo tempo, urge libertar a folha de pagamentos de imensas redundâncias que nada acrescentam em campo e tantos constrangimentos criam à nossa tesouraria e conta de exploração. É impossível resolver o problema de falta de jogadores de referência em apenas 1 ano, mas se resistirmos a ir ao mercado em quantidade como no passado recente e procurarmos apenas qualidade de uma forma efectivamente cirúrgica (2-3 jogadores por ano), fazendo também regressar alguns dos emprestados (Bragança, Dala), então será possível lutarmos pelo título até ao fim em 2021/22. Portanto, duas coisas serão essenciais no futuro próximo: manutenção de expectativas baixas associadas ao crescimento dos miúdos e escolha criteriosa da qualidade que queremos importar para o plantel. Se estas premissas não forem cumpridas e o populismo se sobrepuser à razão, então teremos definitivamente comprometido o nosso futuro. Mas se tudo for cumprido, então estarei disposto a apoiar esse caminho. 

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03
Jul20

Tudo ao molho e fé em Deus

Jogo do Galo


Pedro Azevedo

Geralmente fico muito nervoso antes de um jogo, porém na antecâmara da recepção ao Gil Vicente senti-me bastante confiante. Bem sei, havia condicionantes de peso. Por exemplo, um impressionante surto de bife chorizo afectara o Acuña, o Jovane estava fora devido a um traumatismo (nos resultados dos nossos adversários) e o Geraldes por um triz não conseguira acabar um dos primeiros capítulos do Levantado do Chão, mas nada abalava a minha certeza de que o resultado nos seria favorável. E porquê? Bom, toda a gente sabe que cada partida da equipa de Barcelos é um Jogo do Galo. Ora, como a táctica do Ruben Amorim privilegia os três em linha (centrais), a coisa estava no papo. 

 

Este futebol pós-desconfinamento é muito sui generis, com os adeptos que habitualmente marcam presença nos estádios a verem-se obrigados a assistir pela televisão, em casa ou nos cafés. Procurando transpor por meio virtual as emoções usualmente vividas no José Alvalade, o meu grupo de bancada decidiu reunir-se à hora do jogo no Zoom. A ideia em si tinha tudo para bater certo, com 8 marmanjos de cachecol e fundos virtuais representando o nosso estádio a procurarem dentro do possível replicar as condições do futebol ao vivo. O problema é que a velocidade da fibra varia de lar para lar, pelo que passa a ser possível festejar golos do Sporting em ataques do Gil Vicente e contestar penáltis em lances disputados a meio-campo. Mais arreliador, o enfado com cada nova intervenção do Camacho pode distar 10 a 15 segundos entre cada lar, o que contraria o habitual uníssono. Nada portanto como um espectador desconfiado para lidar (rimar) com um futebol desconfinado.  

 

Foi assim com este enquadramento no meu computador que comecei a assistir ao jogo no televisor. E devo dizer que fiquei boquiaberto. Tanto que até liguei para a MEO. Então não é que a minha fibra é tão, tão lenta que até jurei ver em campo o Damas, o Jesus Correia, o Peyroteo e o Balakov? Um glorioso regresso ao passado em tempo de Regresso ao Futuro? Deixa ver, talvez com o botão do "fast forward"...

 

A primeira parte foi um bocado o que a bola deu e a bola deu para o Plata a levar aos soluços até à linha de fundo e mandá-la para trás. O Sporar dividiu-a com um gilista e o Wendel prensou-a num adversário a caminho da baliza. Estávamos na frente do marcador. Celebravam-se 114 anos de vida do nosso enorme clube e o Plata, isolado, voltou a regressar ao passado. Desta vez até antes da nossa fundação, mais concretamente ao dia 11 de Janeiro de 1906, véspera da data em que o International Board introduziu uma alteração às regras que passou a permitir o passe para a frente. O Gil é que não se deixou enganar e tentou resolver no presente, mas o Damas a.k.a. Max não estava pelos ajustes e por duas vezes negou-lhes o golo que não o galo.  

 

Gostei muito mais da nossa equipa no segundo tempo. Logo a abrir, o Plata, muito activo, isolou o Wendel. Este lá foi para a baliza, fiél ao princípio que o caminho se faz caminhando. Caminhar até caminhou, mas marcar não. Talvez porque o golinho se faz goleando e não caminhando. Uma questão de eficácia. O Sporting pressionava alto (fazendo campo pequeno) e entre campos um gilista assustado procurou livrar-se da bola para trás de qualquer maneira. O Plata agradeceu o presente de aniversário e tocou para o dois-a-zero. Porem, a noite não acabaria sem três momentos singulares. Tudo começou (78 minutos) quando o Matheus Nunes recuperou uma bola e foi progredindo, ora fintando dois para a esquerda, ora driblando os mesmos dois para a direita, até passar a bola ao Wendel. Este tocou para o Borja que de pronto lhe devolveu a bola. O brasileiro tocou para o Sporar, este para o Doumbia, o marfinense para o Ristovski e este para o Plata. A bola ainda chegou ao Wendel até ser perdida. No total foram 30 segundos de "tricô-traça" com as linhas com que se cose o actual futebol do Sporting. A deixar água na boca quanto ao desenvolvimento desta equipa. Por falar em líquidos, o Tiago Tomás e o Joelson deram razão às preocupações da Direcção Geral de Saúde com os ajuntamentos de jovens à noite. Lá se safaram da multa, porque não conseguiram o golo (ou gole). Mesmo no fim, sem ter justa causa para isso, o Ruben Ribeiro marcou-nos um golo. Porém, tal como já nos habituou, o resultado da sua acção foi inconsequente para nós, com o Sporting a conseguir a sua quarta vitória consecutiva em dia de aniversário. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Gonzalo Plata. Menções honrosas para Matheus Nunes (qualidade com e sem bola), Wendel (1 golo), Coates (patrão), Nuno Mendes (revelação) e Max (segurança).

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27
Jun20

Tudo ao molho e fé em Deus

The Karate Kid e o Koffi ora gigante, ora anão


Pedro Azevedo

Na vida é sempre importante sabermos as linhas com que nos cosemos. O Ruben Amorim tem isso presente e, vai daí, aplica-o literalmente ao futebol. O problema é que muita intersecção de linhas gera obviamente demasiados passes laterais e essa tem sido a óbvia consequência de um sistema táctico do promissor técnico leonino que privilegia o engarrafamento na zona central, com dois médios a par e três defesas por detrás ("O Pentágono"). Assim, muitas vezes o Matheus cose e coze o Wendel e este responde assando (as pernas de) o Matheus com passes miudinhos que no rugby se denominam de "para o hospital", auto-anulando-se os dois no que diz respeito ao processo ofensivo e criando indefinição quando toca a defender. Evidentemente, havendo linhas sobrepostas atrás, faltarão sempre linhas à frente, algo que tentamos contornar com a solução do chutão à procura do Sporar, o 112 dos inermes. Quando o esloveno consegue segurar a bola, então aí aparece Jovane, um cabo-verdiano que se descreve melhor recorrendo ao poeta Régio: "a minha vida é um vendaval que se soltou, uma onda que se alevantou, um átomo a mais que se animou". É tudo isto que o Sporting ganha quando Jovane está em campo, os tais últimos 30 metros que comprometeriam irremediavelmente a eficiência da geringonça de passe/repasse outrora montada por Silas ("A Posse")...

 

Andávamos nós neste empastelamento quando os de Belém meteram também as mãos na massa e, pumba, espetaram-nos um pastel: defesa completamente desposicionada e larga no relvado, transição rápida e golo. Mas eis que o Coates foi gigante e o Koffi anão. Qual alto signatário das Nações Unidas, o burquinês estendeu a passadeira a bem da paz e cooperação entre os povos. O uruguaio dedica o golo ao seu antigo camarada de armas, Monsieur Mathieu. Um-dó-Li-cá, e eis que o Codecity volta a marcar. Anulado, por fora de jogo. Por essa altura andava o Plata numa das suas inconsequências quando avista o Ristovski. O macedónio põe a bola com olhinhos na área, o Sporar arrasta marcações e o Jovane mostra que um leão também pode ser um dragão como o Bruce Lee. Depois, o Matheus consegue sair da cabine telefónica onde o meteram com o Wendel e faz um passe longo para o Nuno Mendes. Este dá ao Jovane e o menino inicia intermináveis tabelinhas com o Sporar que acabam com o esloveno caído na área. Penálti, diz Molero, perdão, Malheiro. O Jovane chuta, mas o Koffi dá 2 passos à frente e defende miraculosamente. Tempo então para nos interrogarmos sobre a identidade Sportinguista e os caminhos possíveis para a sua coabitação com uma pluralidade de formas artísticas no futebol português. Molero, perdão, Malheiro também reflecte sobre o tema e eis que perante a incredulidade de todos os leões confinados nos seus lares vemos um árbitro a cumprir com as regras num jogo do Sporting. O Ristovski, desta vez sem galo, sorri. Novamente chamado a tentar converter a penalidade, Jovane desfere uma bazuca de fazer inveja ao António Costa. 

 

Para a etapa complementar o Jovane ficou no banco. Aparentemente, devido a um traumatismo (que provocou no resultado). Entrou o Geraldes e o cão de Pavlov que existe no subconsciente de cada leão Sportinguista começou a salivar. E a verdade é que o Chico até fez um bom jogo, desmarcando-se sucessivamente e assim dando linhas ao portador da bola. Iniciou então um duelo em 3 actos com o Koffi, agora gigante, com o burquinês sempre a levar a melhor. Do Ensaio sobre a Cegueira para o Levantado do Chão é o mesmo Caminho (NA: editora), um caminho que se faz lendo nas entrelinhas do que são os posicionamentos do Chico, uma alternativa aos atalhos à procura do Sporar. Até ao fim pouco mais houve a declarar e o jogo ainda deu para ver entrar o Ilori e o Doumbia e para que o Borja fizesse os 90 minutos sem que o excesso de desconfinamento contagiasse toda a equipa do vírus da tragicomédia. 

 

P.S. Dois livres directos, igual número de penáltis, um canto - eis o balanço de golos de bola parada pós-desconfinamento (4 jogos). Ristovski substituiu Camacho e com um aproveitamento superior, prenúncio de que Amorim está atento à meritocracia. Muitos jovens lançados na equipa principal, sinal muito positivo. Jovane, com 4 golos, duas assistências e participação nos dois desequilíbrios de onde resultaram os penáltis, está em grande. Coisa para logo se agitarem muitos milhões que não mendilhões. Que continue por cá a afagar-nos os corações!

 

Tenor "Tudo ao molho": Jovane Cabral (póquer de menções e de golos desde o desconfinamento)

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19
Jun20

Tudo ao molho e fé em Deus

Retrato de um Jovane


Pedro Azevedo

Em Alvalade há um pintor retratista de grande qualidade. Na semana passado já havia pintado uma tela representando Ricardo Ribeiro, ontem retratou Cláudio Ramos. Em qualquer dos casos bastaram poucos segundos de preparação, pelo que quando os modelos utilizados se mexeram já o quadro estava finalizado. Mas a vida de um artista não é fácil e Jovane teve de vencer o preconceito daqueles que achavam que ele só servia para pintar rodapés, tendo para tal contado com o valioso apoio do inspirador Mestre Bruno Fernandes. Agora, finalmente vencido o anátema da sua formação, ele é o mestre do renascimento leonino. 

 

Qual Ticiano, Jovane não se limita ao retrato, ele também é influente na ilustração de momentos mitológicos. Nesse sentido, "O Calcanhar" foi uma pincelada de génio que valeu um castigo máximo aos tondelenses que desacreditaram da sua arte e "O Roubo de Bola" tornou-se uma extravagante obra inacabada apenas por falta de definição final. Mas foi em dois instantes de representação da religiosidade pagã do futebol, nomeadamente em "Coroação com Espinhos" onde descreve um deus rodeado por um grupo de quatro homens que o açoita, que Jovane mostrou toda a qualidade do seu traço. 

 

Bem sei, Jovane não nasceu naquela Escola de Belas Artes do Seixal que costuma ser muito popular no Médio Oriente. Por isso será improvável que apareçam ofertas das mil e uma noites pelas suas telas. Em todo o caso o seu sucesso recente serve para relembrar os mais distraídos que ali na Pensínsula de Setúbal existe uma outra academia que certamente não por acaso ao longo dos anos vem fomando os melhores artistas do mundo, constatação que deveria sempre ser preservada de politiquices internas que nos deixam de bolsos vazios e só estimulam a promoção dos nossos concorrentes. Ontem, o mais novato do grupo, Nuno Mendes, de 17 anos, fez a sua primeira exposição colectiva, no que foi acompanhado inicialmente por mais 5 jovens que ainda receberam a visita de outros 2 na parte final da referida mostra. E passou com distinção. De forma que se quiserem transformar o ateliê  num caso de sucesso a 2-3 anos não tem nada que saber: dispensem (se possível, recebendo uma compensação) todos aqueles que os mais jovens destronaram e não cabem realisticamente no grupo de 18 (poupando assim nas tintas), mantenham cada um dos putos mais umas épocas (pelo menos até haver opções igualmente  interessantes provenientes das gerações abaixo) e todos os anos contratem só 2 (se sobrar algum, 3) grandes mestres para os enquadrar e melhorar. E guardem a experiência de Mathieu e a combatividade de Acuña para o casamento ser perfeito.

 

Ticiano do "Tudo ao molho...": Jovane Cabral (hat-trick para "Castigo Máximo"). Menções honrosas para Nuno Mendes, Eduardo Quaresma e Matheus Nunes. Camacho esteve um pouco abaixo do nível regular de toda a restante equipa.  

 

P.S. O Sistema? Continuamos com alguma dificuldade de penetração pelo meio, hoje resolvida pela pujança da Ala dos Namorados, a banda esquerda, com bonitas combinações entre os jovens Nuno Mendes, lateral/ala e Jovane, interior.

 

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18
Jun20

Tudo ao molho e fé em Deus

O Lampionato voltou!


Pedro Azevedo

O futebol português é muito divertido. Por exemplo, na conferência de imprensa após o jogo em Vila do Conde, os jornalistas indagaram Bruno Lage sobre as razões da reviravolta benfiquista. O tom geral entusiástico das perguntas fez-me por um momento acreditar que estariam a interrogar um Prémio Nobel da Física sobre a descoberta da radiação cósmica de fundo e seu contributo para um melhor conhecimento da estrutura do Universo. Em resposta, não perdendo a compostura, o próprio treinador benfiquista pareceu personificar o papel de laureado, valorizando muito as virtudes da tal Estrutura e das opções de fundo que tomou. Curioso, fui ver as imagens do jogo. Devo dizer que fiquei um bocadinho decepcionado. É que se por um lado confirmei, e por duas vezes, a (ir)radiação de fundo, vermelha por sinal, por outro verifiquei que ela deveria ter sido atribuída a Luis Godinho e não a Lage. E ainda apanhei o Carvalhal a dizer que já conhecia muito bem o futebol português. Qualquer adepto do Sporting também. Como tal, nem estranhei que o treinador vilacondense, certamente com medo de um castigo, não tenha apontado o dedo a ninguém. O problema é que, se o braço estiver sempre encostado ao corpo (*), não só apontar o dedo se torna humanamente impossível como o contorcionismo e o ilusionismo irão continuar. E, para completar o circo, os palhaços também. Diz(em) que é da educação (física, não cívica)... 

 

(*) O braço encostado ao corpo não cauciona que um jogador o use ostensivamente para desviar a trajectória da bola dentro da área. Na minha opinião, ficou um penálti por marcar a favor do Rio Ave quando o jogo estava empatado e os vilacondenses tinham menos 2 jogadores em campo. 

13
Jun20

Tudo ao molho e fé em Deus

“Jovanotti”, o rap(az) da Formação a dar música em Alvalade


Pedro Azevedo

Três meses depois, o Sporting voltou a apresentar-se em Alvalade. Ou àquilo que as televisões garantiram ser Alvalade, podendo perfeitamente ter sido um estúdio na Venda do Pinheiro, que isto dos Reality Shows que apresentam a banalidade do quotidiano só precisa de um cenário a condizer. Com o suposto regresso a casa, retornou também a ladainha da inexperiência e juventude dos jogadores como causa próxima de uma exibição menos conseguida, reminiscência daquelas conferências de imprensa de Silas em que ele encontrava sempre uma boa justificação para a derrota na utilização de jovens da Formação. O problema destas coisas é termos memória e a alternativa aos jovens da Academia remeter-nos sempre para aqueles "gloriosos" meses vividos anteriormente com as cantorias de Jesé, os tropeções na bola de Bolasie e a enfermaria de Fernando. Aquilo é que (não) era! Para quem já se esqueceu, nada como o momento revivalista que consistiu na troca do jovem Matheus Nunes pelo Eduardo Pés de Barro, esse personagem tão vítima da sua própria inocência que mais parece saído de um filme de Tim Burton (Batman, o argentino, hoje não actuou) com enredo baseado num sonho do rei Nabucodonosor da Babilónia (*). Foi elucidativo!

 

(Verdade seja dita que pelo menos Ruben Amorim tem o mérito de ser consistente nas suas apostas, não desistindo dos jovens à primeira contrariedade e dando-lhes estabilidade e confiança para desempenharem o seu papel da melhor forma.) 

 

O Departamento da Defesa do Sporting voltou a ter a sua sede no Pentágono, realidade que só por si já faz de Ruben Amorim um líder NATO (ou será 'nato'?) em tempo de Guerra Fria em Alvalade. Hoje a missão era passo a Paços destruir o submarino amarelo. O Pentágono, como já se sabe, é compreendido por três centrais e dois trincos que jogam tão perto uns dos outros que o objectivo será certamente entre eles existir um "Ground Zero". Para complicar um pouco mais a tarefa, Mathieu, o Ministro da Defesa e aquele que tem mais saída de bola, não jogou. Valeu então a maior desinibição de Matheus Nunes face ao jogo de Guimarães e o regresso após lesão de Wendel para que o Sporting conseguisse ter algum jogo interior de aproximação à área adversária. Ainda assim, a circulação fez-se essencialmente em zonas muito recuadas do terreno, entrecortada por chutões para a frente (ou atrasos para Max) quando a pressão pacense era mais eficaz e deixava a nu a falta de saída com bola de Coates e Borja. Apesar do controlo geral das operações, os leões na primeira parte só conseguiram criar perigo numa desmarcação subtil de Vietto para Sporar que o esloveno desperdiçou em frente da baliza. Com esta acção, a sua única digna de registo, Vietto deu por terminada a participação no jogo, pois pouco depois sofreu o que pareceu ser uma luxação num ombro. Entrou Plata, e o Geraldes lá ficou a fazer contas aos 10 minutos da ordem que lhe haveriam de caber quando o jogo estivesse em desordem e a bola só andasse pelo ar. No fundo, àquilo que os especialistas designam de uma oportunidade perdida...

 

Regressados do balneário, os leões voltaram a ter em Jovane um dinamitador do jogo. Logo a abrir, o cabo-verdiano entrou em aceleração pela esquerda, driblou dois pacenses sem passo para o acompanhar e serviu um desmarcado Sporar para um golo que teria sido fácil caso o esloveno não tivesse tentado antecipar a jogada dando um passo a mais. Não conseguindo assistir, Jovane procurou resolver por ele próprio: chamado a cobrar um livre directo à entrada da área, o avançado arrancou um míssil indefensável que bateu na quina da barra e ressaltou para dentro da baliza. Matheus Nunes ainda recargou para golo, mas, como a transmissão televisiva esclareceu, a bola já tinha entrado. O Sporting apanhou-se merecidamente na frente do marcador, mas nos últimos 20 minutos, com a substituição de Matheus por Eduardo, acabaria por perder o controlo das operações a meio-campo. Os pacenses começaram a explorar debilidades nossas, como a falta de velocidade de Coates, o deficiente posicionamento de Borja, ou as perdas constantes de bola de Camacho - Quaresma foi de longe o nosso defesa mais competente - , e tiveram uma óptima oportunidade nos pés de João Amaral. Max esteve à altura e defendeu, mas Rui Costa apitou penálti por alegada falta cometida pelo colombiano Borja. O VAR acabou por aconselhar a mudança de decisão e nos lares Sportinguistas por todo o mundo respirou-se de alívio. Até ao final do jogo, os leões não conseguiram segurar a bola, com Plata a ligar o complicómetro vezes de mais para o pobre coração de um adepto, pelo que o resultado esteve sempre incerto. Acuña, fora de forma, saiu e deu lugar a mais uma estreia a assinalar, a do jovem Nuno Mendes. Max, por duas vezes, voltou a evitar o pior na melhor fase do Paços de Ferreira. No entanto, o jogo não terminaria sem que mais uma magistral arrancada de Jovane criasse sensação de golo. Infelizmente, a bola estrelou na barra, tal a fervura aplicada no remate.

 

Enfim, ganhámos! E à falta de nota artística (por exemplo, Benfica e Porto têm sido de uma pobreza franciscana), três pontos e sete jovens da Formação lançados (não considero Camacho, que custou 5,6 milhões de euros e saiu da Academia com, creio, 13 anos) merecem uma boa nota técnica. Só espero é que a necessidade de "nota" para pagar tantas contratações cirúrgicas (ouro, prata, bronze, ferro e... barro, muito barro) não leve a que alguns saiam prematuramente, não concretizando o seu potencial desportivo connosco. Em especial o Jovane, o mal-amado de que tanto gosto.

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jovane Cabral (2º jogo consecutivo). Menções honrosas para Eduardo Quaresma, Max, Wendel e Matheus Nunes. Pela negativa destacaram-se Camacho, Borja, Plata e Eduardo. Os restantes estiveram num nível mediano.  

 

(*) O sonho de Nabuconodosor continha uma estátua de um homem imóvel (de ouro, prata, bronze, ferro e barro), que seria a interpretação da manutenção do seu império até ao final dos tempos. Mas, devido à fragilidade do barro, bastaria uma pedra para destruir o sonho do rei e 24 anos após a sua morte a Babilónia haveria de ser conquistada pelos persas de Ciro, o Grande. 

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05
Jun20

Tudo ao molho e fé em Deus

Um Jovane à solta no berço da nação


Pedro Azevedo

Um maradoniano Jovane, um irrequieto e oportuno Sporar e um Camacho finalmente revelado na posição certa não foram suficientes para o Sporting sair do Afonso Henriques com os três pontos. O que faltou? Desde logo, eficácia - Vietto, por duas vezes, Sporar e Jovane perderam golos cantados na cara de Douglas - , mas também um meio campo que não funcionou - Battaglia muito trapalhão e Matheus Nunes inibido e escondido do jogo - , erros individuais (Max) e má sorte (ressalto que deu o segundo golo do Vitória). Além disso, Marcus Edwards foi sempre um diabo à solta, explorando o espaço existente entre Acuña e Mathieu, conseguindo assim constrangir a subida no terreno dos leões após terem ficado em superioridade numérica. 

 

O Sporting empatou no presente, mas, ao contrário do que tinha vindo a ser habitual, não empatou o seu futuro, e isso foi o melhor que se tirou de um jogo onde a equipa leonina se apresentou desde o início com Max, Quaresma e Matheus Nunes (duas estreias) e Jovane Cabral, jovens da Formação, e durante a partida ainda recorreu a Plata (Camacho fez parte da sua formação em Alcochete, mas custou 5,6M€ para ser resgatado ao Liverpool). 

 

Jovane esteve num nível superlativo, com uma assistência, três passes para golo, a expulsão provocada por uma acção de ruptura sua e um irrequietismo permanente que pôs a cabeça em água à defesa dos Conquistadores. Além disso, protagonizou dois momentos de pura magia numa cabine telefónica (junto à linha de fundo), um em cada parte, só ao alcance de predestinados. Apresentando-se com uma disponibilidade física superior à da maioria dos jogadores presentes no relvado, as suas movimentações abriram imensos espaços no último reduto vimaranense. Infelizmente, na frente, só Sporar (dois golos) o acompanhou a bom nível, na medida em que Vietto voltou a exibir a sua esmerada arte de perdoar em frente da baliza. A actuação do cabo-verdiano esteve muito perto de merecer a nota máxima, tendo apenas lhe faltado o golo para atingir a perfeição.  

 

Quanto a Ruben Amorim, esteve na globalidade bem. Apostou nos miúdos e lançou dois jogadores nos corredores com grande propensão ofensiva (Camacho e Acuña, este último ontem a meio-gás), ambos suportados no sistema de 3 centrais, mostrando assim uma ideia de futebol em consonância com o clube grande (enorme) que representa. Sendo certo que a genialidade de Edwards expôs que a mecanização entre os laterais/alas e os centrais ainda está longe de ser a necessária e que ao miolo do terreno faltou clarividência e maior assumpção do jogo, a verdade é que o Sporting revelou trabalho no regresso à competição. Como sinal menos a entrada de Doumbia, o que viria a impedir posteriormente uma melhor definição das posições "6" e "8" a partir do momento em que os leões passaram a ter mais 1 jogador em campo. Aliás, o duplo-pivot à frente de 3 centrais parece-me ser o grande equívoco deste sistema de Ruben Amorim - quando em postura defensiva (linha defensiva de 5), enquanto nas alas o lateral do lado da bola sai e a defesa fica a 4, no centro não parece haver essa rotina (saída à bola de um dos centrais) - , notando-se claramente a ausência de um médio centro capaz de transportar verticalmente a bola desde trás. Na ausência de Wendel, Matheus Nunes poderia e deveria ter sido esse jogador (tem qualidade para isso), mas a verdade é, que muito amarrado (pelo sistema e/ou por o que pareceu ser medo cénico e inexperiência), pouco ou nada ousou. De todo o modo, nota positiva para o treinador leonino, que viu a sua equipa sofrer 2 golos fortuitos que impediram o que teria sido uma justa vitória. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jovane Cabral (parte consecutivamente para cima dos adversários, procurando o 1x1, sem complexos).

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04
Jun20

Dia de Sporting


Pedro Azevedo

Hoje é Dia de Sporting. Do Sporting que faz sentido, aquele que vai a campo e nos tocou no coração quando éramos crianças. É certo que sem ninguém nas bancadas, o que já não faz nenhum sentido e parece até entrar em contradição com a origem deste amor. Desta vez, o amor vai ser mesmo fogo que arde sem se ver... no estádio.

 

Mas, finalmente, quase 3 meses depois, a bola vai recomeçar a rolar e a nossa paixão sublimar. Quando o árbitro apitar para o início do jogo, todas as nossas diferenças se dissiparão. Essa é uma premissa que um adepto tem sempre em mente, a simbiose que se estabelece com quem veste de verde-e-branco. O contrário seria parasitismo, indigno de um leão. 

 

Espero que o Sporting ganhe e que faça um bom jogo. Igualmente, desejo que o Ruben Amorim confirme os sinais positivos dados nos treinos, os quais têm chegado até nós pela imprensa. Esta visita a Guimarães recorda-me a minha primeira experiência no então Municipal da cidade berço. Jogava-se a penúltima jornada do campeonato de 79/80 e o Sporting precisava de ganhar para se manter na liderança. Viajei desde Lisboa no Comboio Verde com o meu pai, mudei de composição em Campanhã e lá cheguei a Guimarães. O jogo foi renhido e marcado por dois momentos em que estiveram envolvidos ex-jogadores do nosso clube. Um deles, o Manaca, foi particularmente infeliz quando saltou entre 2 jogadores nossos e com o cocuruto fez o auto-golo que nos adiantou no marcador. O outro, Vítor Manuel, avançado, obrigou o Fidalgo a uma defesa incrível que custou ao nosso corajoso guarda-redes o embate com a cabeça contra o poste esquerdo da baliza. Curiosamente, na semana seguinte festejámos em Alvalade contra uma equipa, União de Leiria, também com muitos antigos jogadores nossos. Entre eles o Dinis, o brinca-na-areia. Nesse dia tínhamos de ganhar, e ganhámos por 3-0. E o Porto tinha de ganhar e esperar que o Sporting perdesse, e perdeu duas vezes. No que dependia de si, em Espinho, contra o Sporting local, treinado pelo Manuel José. Mas voltando a Guimarães lembro-me da alegria do regresso com o título quase no bornal. E do calafrio em Campanhã, quando alguém atirou um paralelipípedo que por pouco falhou a janela do nosso compartimento. Infelizmente, por via disso, neste regresso ao passado, ao contrário do futebol do Sporting que já teve melhores dias, a forma como alguns adeptos estão no desporto não saiu beneficiada.

02
Jun20

Duelo de treinadores da moda


Pedro Azevedo

Ivo Vieira vs Ruben Amorim, duas boas ideias de jogo em confronto, um duelo de treinadores da moda para ver na Quinta-feira, às 21h15, no Afonso Henriques (era bom era, é mesmo exclusivamente via SportTV). 

 

Que sistema táctico apresentará o Sporting em Guimarães? 3-4-3 (que na verdade defensivamente é um 5-4-1) ou 3-5-2? Ruben Amorim parece ser mais fã do primeiro, mas talvez as características dos jogadores do Sporting se coadunem mais com o segundo. Exemplo: Vietto renderá sempre mais partindo do centro e Plata pode jogar solto como segundo avançado. No caso do treinador leonino optar pelo 3-4-3, Vietto partirá da ala esquerda e Plata da direita. 

 

Não esquecer também as debilidades defensivas de Vietto, as quais se notarão mais na ala esquerda do que no meio com 2 médios e 3 centrais nas costas. Adicionalmente, nessa ala (direita para o Guimarães) o Vitória tem provavelmente o seu jogador mais valioso, Marcus Edwards, um miúdo formado no Tottenham e internacional em todos os escalões jovens ingleses, que sem marcação forçará muitas vezes o 1x1 contra Acuña. No 3-5-2 poderia ser pedido ao "8" que tivesse mais em atenção as entradas do inglês por esse flanco. A Sporar seria solicitado que fechasse a saída de bola pelo lateral direito (Sacko ou Victor García) vimaranense. 

 

Outra dúvida prende-se com o substituto de Wendel (lesionado) no meio campo. Quem será o escolhido para jogar à frente (previsivelmente) de Battaglia: Matheus Nunes, Eduardo ou Geraldes? 

 

E o Leitor/Comentador, em que sistema jogaria e qual seria o seu "onze"?

 

Tic, tac, está quase a (re)começar a Primeira Liga. Não perca o rescaldo do jogo directamente da cabine de vôo (o único local onde pode estar Tudo ao molho e fé em Deus) de "Castigo Máximo". [É só olhar em frente (para o seu computador).]

23
Fev20

Tudo ao molho e fé em Deus - Leão de Plata


Pedro Azevedo

Caros Sportinguistas, este foi o jogo de Plata. Mas, antes disso, talvez seja bom reflectirmos sobre  o quanto o futebol do Sporting melhorou a partir do momento em que Silas começou a jogar com dois alas puros. Não com uma estrela do raggaeton e um segundo avançado travestido de extremo, mas com dois alas a sério. Já tinha acontecido com o Basaksehir, voltou a suceder hoje contra o Boavista. Desta vez com uma nuance: o jovem Plata no lugar do maduro Bolasie. Se há dias de glória para os treinadores de bancada, este foi um deles. É certo que o requerimento de jogar com alas revestia-se de uma ululante forma de óbvio, mas é sempre reconfortante quando uma teoria se traduz na prática em algo que faz a nossa equipa ganhar mais vezes. Mais ainda quando a tal se adiciona a aposta na Formação e a nossa vitória no campo vem acompanhada da derrota do caminho que nos afasta da sustentabilidade.  

 

Em crónicas como a do jogo de Vila do Conde tinha ficado subjacente a solidão dos leões. Nunca uma equipa do Sporting ficara tão só como a nossa sem Bruno Fernandes com o Rio Ave, sentimento de orfandade extensível a sócios e adeptos. Um clube que nasceu para ser grande, que enorme tem sido durante toda a sua história, ameaçava deixar de o ser. William Blake dizia que o caminho do excesso leva-nos ao palácio da sabedoria, e a verdade é que uma prossecução de erros em excesso encaminhou-nos para o único caminho possível, o da luz: com as duas alas dos namorados, flanqueadores puros e jovens da nossa Academia, seremos mais felizes e sustentáveis. 

 

E agora o Plata. Contra os turcos não houve Bruno, mas houve Jovane. E Vietto. Hoje voltou a não haver Bruno. Mas houve Plata. E Vietto. Mas eu quero falar do Plata. O Plata fez xeque-mate no tabuleiro axadrezado após, uma a uma, ter deitado todas as peças boavisteiras, a última das quais, experiente de outras guerras, não caiu sem antes ter mostrado os pitons bem em riste. Por isso, em Domingo Gordo, o equatoriano foi o Rei Momo do Carnaval Sportinguista. A serpentear e assim abanar o lado esquerdo da defesa nortenha, a servir Sporar para o primeiro da tarde solarenga, a mostrar sentido de oportunidade no golo anulado e no golo confirmado, ou a assistir Jovane. Também a falhar com estilo, como quando abusou da força num passe que se afigurava fácil para Sporar, ou quando foi macio de mais na recepção de um serviço açucarado de Jovane. Imaginam o Plata quando encontrar as doses q.b. de força e macieza? É este apuramento, este trabalho de ourives que o Sporting não pode deixar de fazer. O talento, em bruto, está lá. Falta encontrar o artesão certo na próxima época. 

 

Está a terminar o tempo do profano. Quarta feira de cinzas inicia-se a Quaresma. É o tempo do sagrado. O nosso deus dos estádios já não mora aqui, anda agora por Manchester a mostrar o seu dom entre os comuns mortais. Não havendo deus Bruno, temos de nos agarrar aos que formamos, algo que devia ser "sagrado" para nós. O Dala bisou pelo Rio Ave, o Gauld também pelo Farense. O Mama marcou pelo Dijon. O Palhinha está em grande no Braga, o Domingos é um dos melhores da La Liga e o Matheus Pereira brilha em Inglaterra. Há que resistir à tentação de tentar justificar no campo o injustificável racional de certas contratações e/ou opções de mercado. Em tempo de Quaresma, os sócios já não vão em carnavais. É, sim, hora de pensar em mudar de vida e apostar convictamente nos miúdos. Se é para perdermos os anéis, ao menos salvemos os dedos. 

 

P.S.1 A luta pela Liga Europa continua renhida, mas nada há a temer. Já temos rulote, pés descalços, a barraquinha dos tirinhos (no mercado) e uma montanha russa de emoções à solta, agora só falta a UEFA restaurar a Taça das Cidades com Feiras...

 

P.S.2 Hoje tivemos em campo 5 miúdos que passaram pela Academia e outro, mais velho, que por lá passou e regressou. Ganhámos! (O presente e o futuro.)

 

P.S.3 A nossa equipa sénior feminina de futebol jogou (e ganhou) com o Benfica. A partida, disputada em Alcochete, sobrepôs-se à da equipa sénior masculina de futebol, o que certamente não contribuiu em nada para a divulgação do futebol feminino. Longe de Alvalade, numa semi-clandestinidade (tal como a equipa de rugby), as nossas leoas continuam a ser encaradas como o parente pobre. Mais estranho ainda quando em campanha Varandas tanto falou em igualdade e até apresentou uma senhora, Helena Ferro de Gouveia, jornalista, a pensar na inclusão da mulher no desporto. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Gonzalo Plata 

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16
Fev20

Tudo ao molho e fé em Deus - Do Céu caiu um Jovane


Pedro Azevedo

O sonho de qualquer adepto encartado é ser o Wendel. Quem não gostaria de poder caminhar livremente pelos relvados deste país a sentir de perto o bafo e o suor dos guerreiros em campo enquanto enverga o melhor traje de passeio? Nessa óptica, o brasileiro é um repórter privilegiado, o paradigma de uma inovadora Experiência Sporting num estádio de futebol. É também, infelizmente, um produto da forma como no Sporting se vê a meritocracia...

 

Se o Wendel é o sonho de qualquer adepto, ter um gabinete de scouting é o sonho de qualquer presidente. Como não amar estes arqueólogos, capazes de desenterrar uma múmia colombiana em terras mexicanas a um preço apenas ligeiramente superior ao produto da venda de um Merah Demiral, ou de um Domingos Duarte? Reparem, observar o Borja em campo é toda uma experiência sociológica. Aquelas acelerações seguidas de travagens bruscas e marchas-atrás e a atracção pela bola e esquecimento do espaço que o caracterizam são reproduções de um episódio do Lost que começa com o colombiano a cair de pára-quedas na Península de Setúbal (Alcochete). 

 

Logo após ter sido eleito presidente, Frederico Varandas decretou e anunciou a todos os Sportinguistas que a Formação leonina, entre os 17 e os 23 anos, não tinha qualidade. Parece que faltavam relvados e os que havia tinham buracos, o que como se sabe favorece mais o aparecimento de talentos como o Tiger Woods do que craques como o Cristiano Ronaldo. A ideia geral era que a Formação tinha regredido. Entretanto, o Domingos Duarte foi vendido pelo preço de compra de um Tiago Ilori e posteriormente concluiu-se que o nosso formando mais recente afinal era melhor do que o regressado formando mais antigo. Reconheça-se que o Demiral e o Palhinha já tinham saído, mas é difícil imaginar que não fizessem parte do decreto, pelo que o mais certo é Cintra ter poupado mais um dissabor a Varandas. Entretanto, o Palhinha marcou ao Benfica (quebrando o enguiço do Braga na Luz), Matheus Pereira (6 golos) assistiu pela 14ª vez no empate do líder WBA contra o Nottingham Forest, Domingos Duarte foi eleito para o Onze Revelação da La Liga, o infortunado Demiral tirou a titularidade a De Ligt (transferência de €70 milhões) na Juventus antes de se lesionar com gravidade, Daniel Bragança, Ryan Gauld e Leonardo Ruiz têm estado em evidência em, respectivamente, Estoril, Farense e Varzim, Gelson Dala regressou a Vila do Conde com um grande golo e Mama Baldé, o jovem cedido de borla para o Dijon a fim de baixar o elevado valor de aquisição do entretanto desaparecido em combate Rosier, é o melhor marcador do Dijon na Ligue 1. Esta constatação leva-me a pensar que o Sporting não está a formar mal para os outros. A formar para si próprio é que já é outra coisa. Por exemplo, o Jovane não tem capacidade para ser titular. Vejam lá que apenas resolveu 3 dos últimos 4 jogos do clube, algo manifestamente insuficiente para merecer uma oportunidade decente. O Max também está à experiência, mesmo que a cada jogo vá evitando males maiores. Por isso, os jornais já dizem que o sueco Robin Olsen é alvo para a próxima temporada, algo que o presidente Varandas não desmentiu. Tudo isto confirma a narrativa oficial: infelizmente, a Formação não tem a qualidade necessária. 

 

Ontem, em Vila do Conde, o Sporting é capaz de ter feito o jogo mais miserável de que tenho memória em 45 anos que levo de ir ao futebol. De um lado, uns rioavistas sempre a chegar primeiro à bola, todos procurando dar linhas de passe, sempre em movimento, a fazer lembrar uma equipa da Premier League, assim a género de um River Bird. Do outro, uma equipa incapaz de ligar dois passes sem primeiro ter de executar todos os passos de segurança incluídos no protocolo de Quioto Silas para as transmissões de bola, com dispêndio de energia mínimo e zero de talento e de remates enquadrados na baliza. Um Sporting a jogar à equipa pequena, sem ligação entre sectores, esterilizando a bola no seu meio-campo e sem capacidade de progredir no terreno. Um Rio Ave afoito, consciente do que estava a fazer no campo, com jogadores mostrando alardes técnicos passíveis de envergonhar uns tantos leões pernetas, para o efeito transformado no grande da ocasião. Noutro plano, um treinador (Carvalhal) empenhado em sistematizar princípios de jogo, optimizar rotinas e promover um futebol agradável para as bancadas versus Silas, o mau da fita, campeão da posse estéril e Che Guevara dos sistemas tácticos, paladino de um estilo futebolistico sem princípio, meio e fim.

 

Como nenhum outro desporto, o futebol tem um sortilégio muito especial. Assim, é sempre possível a um David bater o pé a um Golias. Ontem, o David foi o Sporting, o que não surpreende dada a falta de noção que se alastra por toda a cadeia de comando, desde Varandas e Zenha até Silas, ninguém percebendo muito bem a grandeza do clube que representa. A fisga do David foi Jovane, a estrela caída do Céu que voltou a resolver. Aliás, Jovane e Max, dois produtos da nossa Formação, têm sido os mais consistentes jogadores do Sporting nos últimos 4 jogos, não se compreendendo a razão pela qual o ala caboverdiano continua a assistir do banco à inconsequência de Camacho, indiferença de Jesé (titular contra Marítimo) ou trapalhice de Bolasie (ontem conseguiu sacar um penalty de uma bola que se esgueirava pela linha de fundo). Ninguém entende, como também é difícil perceber porque o Matheus Nunes ainda não jogou, ele que tecnicamente é mais refinado do que Wendel "e pur si muove" (e, no entanto, move-se/Galileu).   

 

P.S. Exuberância irracional foi um termo usado pelo então presidente da Reserva Federal americana (FED), Alan Greenspan, em 1996, durante a bolha tecnológica vivenciada nos anos 90, para dar um sinal aos operadores que o mercado accionista poderia estar sobreaquecido. Por sua vez, "New Normal", ou novo normal (em português), é um chavão usado na economia, em finanças ou nos negócios para classificar as condições resultantes da crise financeira de 2007-2008 (alargou-se a Março de 2009) e da recessão global de 2008-2012, onde o que antes era considerado anormal se tornou comum. 

 

No Sporting tivemos um episódio de exuberância irracional que marcou tristemente as últimas acções de Bruno Carvalho como presidente do Sporting e hoje em dia, em pleno consulado de Frederico Varandas, vivemos o "novo normal". 

 

Para o Sporting voltou a ser normal não aspirar a mais do que o terceiro lugar no campeonato nacional de futebol. Mesmo este parece seriamente ameaçado este ano, antes desta jornada com 3 clubes a uma distância de apenas 3 pontos na perseguição à nossa equipa. Ora, por muito que se invoque Alcochete e a rescisão de alguns jogadores nucleares da equipa como justificação para o fracasso, a realidade incontornável é que o Sporting continua a gastar em custos com pessoal um valor entre 65 e 70 milhões de euros que deveria ser suficiente para a sua equipa de futebol estar muito mais perto dos 2 primeiros do que de clubes que têm um terço, um quarto, ou um quinto do seu orçamento. Ora, não é isso que acontece quando os leões distam 19 e 15 pontos dos dois primeiros colocados. 

 

Como facilmente se conclui, o Sporting gasta demasiado para os resultados que obtém, o que significa sem tergiversações que não tem uma boa gestão desportiva. Isso é um dado adquirido nada ambivalente e é bom que os sportinguistas dele tenham plena consciência. Por isso, causa-me apreensão que o conformismo venha tolhendo a capacidade de raciocínio da maioria, como se o que nos tem acontecido nesta época desportiva fosse algo inevitável e pouco se possa fazer no presente e futuro para inverter este ciclo de "normalidade" de maus resultados. 

 

Assim, não vale a pena enfiarmos a moleirinha na areia como a avestruz. Pese embora tal pudesse evitar que no-la ameaçassem de arrancar, é preciso não olvidar que haveria o perigo de lesões do foro da cabeça que um distinto presidente/médico considera como da mais difícil resolução. 

 

Tenores "Tudo ao molho...": Jovane Cabral e Max

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10
Fev20

Tudo ao molho e fé em Deus - "Siclete"


Pedro Azevedo

Silas tem um conceito de futebol que privilegia a posse de bola. Porém, há um problema. Enquanto na física, ou química, uma acção gera uma reacção, no futebol de Silas a posse de bola é simultaneamente acção e reacção, não tendo uma finalidade fora deste circuito fechado que possa ser observada no campo. Assim, a bola vai circulando para trás e para a frente e da esquerda para a direita até voltar à sua posição inicial e repetir-se o ciclo. A coisa seria interessante se o jogo fosse o da Rabia, assim é só chato, previsível e mastigado para quem assiste da bancada ou na televisão. Porém, para Silas é um placebo: "ter" dá-lhe uma tranquilidade que o "não ter" não lhe dá. É também um trunfo nas conferências de imprensa. Por isso, enquanto os ingleses inventaram o futebol e lhe atribuiram um objectivo ("goal"), Silas já patenteou o Siclete (contracção do nome próprio "Silas" com o substantivo "chiclete") com o propósito de integrar a futura Taça dos Clubes Campeões Europeus de Estatística, competição que irá gerar uma distribuição (normal) de... dados probabilísticos. 

 

O Sporting começou num 3-5-2, o sistema que melhor permite compatibilizar Vietto na equipa. É também o sistema que mais favorece o Siclete, na medida em que, sem alas puros, vai acumulando jogadores no centro do terreno e concomitante empastelamento do jogo para gáudio do treinador. Para piorar, um Battaglia ainda receoso e um Wendel em greve durante o primeiro tempo não deram a intensidade requerida e o Portimonense ia conseguindo controlar as operações. Num cenário assim, apenas a qualidade poderia desbloquear o marcador. Ora, a qualidade não tem condição física ou idade, razão pela qual um manco e um avô se conseguiram ainda assim destacar entre o marasmo. Max, um jovem promissor, evitou que os leões fossem para o intervalo em desvantagem.

 

No segundo tempo o Sporting mudou de sistema, trocando Neto por Jovane Cabral. Em 4-3-3, os leões foram mais perigosos. Ainda assim, a igualdade ia teimando no marcador e Vietto, em duas ocasiões, provou não ser Bruno em frente da baliza. Eis então que a réstia de qualidade da nossa equipa volta a aparecer: Acuña, ocasionalmente deslocado sobre a direita, efectua um centro largo para o segundo poste e o mal-amado Jovane - um jovem que vai para cima do seu adversário e é sistematicamente preterido por um Camacho que neste jogo se mostrou adepto de floreados inconsequentes - corresponde da melhor maneira colocando a bola com malícia na frente do isolado Sporar. Na tentativa desesperada de evitar o golo, um algarvio (Jadson) acabou por confirmar o iminente golo. Até ao final do jogo, destaque para uma defesa de Max a segurar a vitória e para um remate ao poste do entretanto despertado Wendel.

 

Mesmo contra o 17º colocado da Primeira Liga e a jogar em casa, o Sporting venceu tangencialmente. A falta de qualidade global da equipa é notória e Silas será provavelmente parte do problema mas não é "o problema". Aliás, o jovem treinador é já o 5º da dinastia varandista, pelo que a sua substituição neste momento não auguraria nada de bom dado o histórico dos recrutadores. É o próprio Varandas que o admite quando dá como provável que o despedimento de Keizer tenha sido injusto em razão de um mau planeamento da época por parte da Estrutura - algo que agora admite, mas que quando na altura própria foi alvo de crítica por sócios e adeptos atribuiu a "cientistas" e a ignorantes em matéria de futebol - , não se percebendo se no momento da tomada de decisão de afastamento do treinador holandês a percepção de mau planeamento por parte da Estrutura já existia ou se só foi criada agora. Logo, a pergunta que se impõe é a seguinte: quantos treinadores ainda precisaremos de ter até que o mau planeamento da época tenha consequências que impactem os planeadores?  

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jeremy Mathieu

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P.S. Hoje à tarde, após o derby do futsal, um vice-presidente e um vogal do Conselho Directivo foram agredidos por adeptos do clube. Uma menina, adolescente, filha de um dos dirigentes, foi cuspida. Tal foi narrado pelo Record e posteriormente confirmado por Frederico Varandas. À hora a que Vos escrevo, segundo as televisões, a informação conhecida é a de que os agressores ostentavam dísticos da JL, organização que em comunicado repudiou e condenou os actos de violência.

 

Um acto ignóbil destes, caso flagrante de (in)segurança pública, não pode passar incólume. Se às autoridades policiais caberá indentificar os perpetradores das agressões, ao Conselho Fiscal e Disciplinar do Sporting cumprirá instaurar os processos que conduzam à sua expulsão de sócios (caso o sejam) e proibição de entrada nas instalações. Mas chega de surfar na maionese. Todos os que me leem sabem que detesto divisionismos no meu clube, que desde Alcochete me bato e alertei contra os maniqueístas que vão manietando o Sporting em nome de proselitismos vários, endurecendo no processo a linguagem. Porém, o clube está doente, refém da falta generalizada de estratégia de uma Direcção (o que a enfraquece), de uma mesa da AG que vai empurrando decisões com a barriga e de um conjunto de adeptos com um comportamento inadmissível, onde se incluem membros das duas claques a quem forem retirados benefícios e que se manifestam sonoramente contra a Direcção no estádio no decorrer dos jogos. Por outro lado, a oposição mais visível à actual Direcção e com maiores responsabilidades desde as últimas eleições - não interessa para o caso se mais ou menos activa - , que existe e tem cara(s), por omissão vai caucionando, como causa provável por motivos eleitoralistas, este tipo de acontecimentos e comportamentos, não se ouvindo uma palavra sua que faça doutrina no sentido de os tentar prevenir. Existe assim um enorme vazio de autoridade e uma total ausência de magistério de influência no Universo Sporting que recomende a necessária ordem e tranquilidade, criando-se assim um latente barril de pólvora pronto a detonar. Acresce que este ambiente geral acaba por abafar a legítima contestação de sócios e adeptos moderados e ordeiros que não se revêm na actuação destes Orgãos Sociais e gostariam de encontrar uma forma civilizada de cidadania leonina que lhes permitisse expressar as suas inquietações em democracia.

 

Perante tudo isto, o Estado teria de intervir como repressor da violência. Acontece que o Secretário de Estado do Desporto (e o seu chefe, o Ministro da Educação) continua a circunscrever o tema à instituição, ele que deveria ser o maior interessado em erradicar a violência no desporto. Igualmente, o Ministro da Administração Interna parece ignorar que a violência na sociedade está a montante do desporto. É que a segurança pública, sendo um direito e responsabilidade de todos, é um dever do Estado, assim como o direito à integridade pessoal assiste aos cidadãos. Nesse sentido, o artigo 22º da Constituição da República portuguesa (Responsabilidade das entidades públicas) reza o seguinte: "O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem". É por isso tempo de dizer basta! O Estado não pode continuar a demitir-se das suas funções. 

03
Fev20

Tudo ao molho e fé em Deus - O sentido da vida leonina


Pedro Azevedo

A gente já sabe do que a casa gasta, que o presidente é o que é, o treinador idém (mais "marxismo-leoninismo" com a equipa sub-virada para a esquerda e a abrir crateras à direita) e os jogadores idém aspas aspas, mas também não é necessário enviarem-nos um médico legista com vontade de apressar o óbito, não é assim? Num dos filmes dos Monty Python, "O Sentido da Vida", um dador recebe a visita de uns médicos que lhe pretendem extrair os orgãos para transplante. Ele bem alega que a doação só estava programada para acontecer após a sua morte, ao que os médicos lhe garantem que estão lá exactamente para garantir isso, que ele morre, começando a remover-lhe as vísceras a sangue-frio. Acaba assim por produzir-se uma subversão: ele morre em consequência de ser dador, não deixando porém de ser dador em consequência da sua morte.  

 

O filme dos génios de comédia britânicos é uma alegoria do que é o contexto do futebol português. Nesta fita do ludopédio tuga, Frederico Varandas, que por coincidência também é médico, desempenha o papel do incauto que julga estar a produzir um "statement" quando diz que há 3 formas de lidar com a derrota - com dignidade, histerismo ou cobardia - , não entendendo que está a dar luz verde(!) para que todo o tipo de diatribes ocorra sem que se possa pronunciar, refém que ficou das suas palavras anteriores.

 

Ontem, na Pedreira, o futebol português regressou à Idade da Pedra. Convenhamos que não haveria melhor local para tal acontecer, sendo certo que em Portugal a realidade supera muitas vezes a própria ficção. Nesse transe, foi possível ver um árbitro apitar uma falta de jeito a si próprio imediatamente após o avançado esloveno recém-contratado pelo Sporting se libertar de um adversário e se isolar para a baliza. O pobre do Sporar percebeu instantaneamente onde se veio meter, ele que abandonou a liga eslovaca para integrar uma liga eslovaca-louca onde há um boi à solta no Estádio Nacional que ninguém sabe bem quem é, e é impossível alguém que venha por bem ficar de pé perante a doença que se propaga à volta. A confirmá-lo, numa primeira fase os nossos começaram a ficar amarelados até que acabaram por sucumbir. 

 

No fim do jogo, o Neto, aparentando falar para fora, falou para cima. O presidente, aparentando falar para fora, falou para dentro, para os sócios. Se por um lado é fácil compreender que sem orgãos que deem poder ao corpo isto não vai lá, também não podemos nós ser incautos ao ponto de não entender que a estratégia de Varandas falhou por completo. E em todas as frentes, desde as "contratações cirúrgicas" aos 5 treinadores em pouco mais do que 1 ano, não esquecendo o "unir os sócios" e o aumento da remuneração dos administradores da SAD aprovado contra o voto unânime de todos os outros accionistas da sociedade após Dost ter sido dispensado com o argumento de alívio salarial (situação que aliás nos deixou com um único ponta de lança inscrito para atacar a primeira parte da época). Deste modo, só nos restam duas alternativas: ou agimos, ou ficamos em casa à espera do dia em que nos venham remover o cartão de sócio. "Time to say goodbye"? 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Max

28
Jan20

Tudo ao molho e fé em Deus - À noite em Alvalade


Pedro Azevedo

O fim de semana trouxe a triste notícia do desaparecimento de "Black Mamba", um dos melhores jogadores de sempre da NBA. Kobe era também um grande entusiasta de futebol e do AC Milan, consequência de aos 6 anos de idade ter acompanhado o pai, também profissional de basquetebol, quando este abandonou a NBA para jogar em Itália. A morte de Bryant fez-me pensar o que seria o desporto sem os grandes atletas e o quão importantes estes têm sido na divulgação e crescimento das diversas modalidades. É curioso, pois no Sporting há quem cultive o "zero ídolos", o que na prática vale por dizer que para alguns um Eduardo merece a mesma consideração que um Bruno Fernandes. Como nestas coisas sempre fui um bocadinho desalinhado com as tendências, apesar da noite chuvosa peguei em mim e desloquei-me a Alvalade para ver mais uma das putativas despedidas do Bruno.   

 

Peter Handke escreveu "A angústia do guarda-redes no momento do penalty", obra muito aclamada pela crítica. O austríaco, nóbel da literatura em 2019, não deve conhecer bem a realidade leonina. Se a conhecesse teria o guião perfeito para um novo Best Seller: "A solidão de um adepto num estádio de futebol". Em Alvalade habitualmente estamos sozinhos mesmo quando acompanhados por muita gente. O ambiente geral maniqueísta, o niilismo e o conformismo que perpassa as bancadas assim o determina, bem como a forma como se desprezam símbolos do clube como o hino que entoa com o jogo já a decorrer. Mas ontem o sentimento de solidão foi literal, tão poucos eram os adeptos nas bancadas: o "Hoje em Alvalade..." calou-se para descanso dos tímpanos massacrados pela habitual ruidosa verborreia proveniente dos altifalantes do estádio, mas segundo a SICn estiveram em Alvalade 12 788 espectadores, cerca de 25% da capacidade total do recinto. Enfim, a união parece estar a avançar a toda o gás. Desconfio é que o gás seja letal...

 

Exibição pobre, paupérrima até, apenas abanada com a entrada de Jovane Cabral. O caboverdiano, numa cruzada contra o preconceito da falta de qualidade da Formação, realizou mais em 20 minutos no campo do que todos os colegas (excepção talvez a Bruno) no tempo inteiro. Na retina ficou a construção do único golo validado do jogo - como diz o adágio popular, à terceira foi de vez - , uma série de fintas no espaço de uma cabine telefónica que culminaram num livre directo em posição auspiciosa e um remate que só o inefável Rui Costa - pois é, o amarelo não assenta bem a jogadores habituados ao clima temperado das ilhas - não viu ter sido deflectido pelo persa que habitou a baliza insular. A novidade foi o Borja ter marcado um golo. No resto do jogo dedicou-se ao inconseguimento habitual, alternando momentos de fulgor como deixar um adversário prostrado no relvado com tacadas na bola directas à linha lateral. Mas, ao fim de 365 dias por cá, já perdeu o medo de entrar na área. Chutou a 10 metros da baliza, com o guarda-redes no chão, e acertou na baliza. Logo foi incensado por todos e à saída até ouvi dizer que o Acuña já podia ir embora. Bem sei, estava uma chuva de molha-tolos...

 

O Sporar estreou-se. Não parece ser um Slimani como cheguei a ver anunciado em programas televisivos. Antes se assemelha a um Volfswinkel. Nas movimentações e na silhueta. Nota-se que procura o espaço, ataca a profundidade mesmo não sendo muito rápido e não é de lutar pela bola na área. Mas tem um remate forte e colocado e combina bem com os colegas. Dir-se-ia ser um avançado centro, não fora a denominação em Alvalade já estar tomada por um tal de Jesé.

 

O resto do jogo foi tão emocionante que me dediquei a pensar nas singularidades da vida lusa. (É o que me acontece geralmente quando o José Alvalade se transforma numa espécie de campo de desconcentração.) À atenção do Dicionário Priberam: em Portugal, semântica é sinónimo de conveniência. Senão, vejam bem: a discussão do momento é entre o que é um "hack" e o que é um "leak". Parece que o Rui Pinto é um "hacker" e o Assange publicou uns "leaks" provenientes de uns "whistleblowers". Depois, há dois tipos de "hackers", podendo até os dois coexistir na mesma pessoa. Por exemplo, o Pinto vira Robin dos Bosques aquando dos Luanda Leaks, mas é um perigoso pirata informático se estivermos a falar do Benfica. É o que médicos e criminalistas denominam de intrigante caso de bipolaridade cibernética. Entenderam? Eu também...

 

Uma última palavra para aquele senhor que tem sempre os máximos ligados quando faz os editoriais do Jornal Sporting: menos... (Iluminismo e iluminação não são bem a mesma coisa.)

 

Valha-nos que a relva ainda é verde...

 

Tenor "Tudo ao molho...": Jovane Cabral

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18
Jan20

Tudo ao molho e fé em Deus - Apocalypse mau


Pedro Azevedo

É complicado um homem chegar a uma idade adulta e descobrir que foi enganado pelo seu progenitor durante uma vida. O mesmo que desde tenra idade me afiançou coisas que aliás de tão verosímeis à época tomei como absolutamente axiomáticas, do tipo de o Sporting ser um clube diferente para melhor, o nosso fundador ter sido José Alvalade, ou o verde ser a cor da esperança. Até que um dia um homem acorda, choca de frente com a realidade e, enquanto coloca o penso (logo existo) na cabeça e induz o método cartesiano, vê a verdade passar-lhe perturbantemente pelos olhos. E nesse processo vislumbra um clube de niilistas, provavelmente fundado por um tal de Nietzsche, onde impera o vale-tudo, não se acredita em nada e a única Esperança é a filha de um consócio vindo de Marte. 

 

No actual estado de coisas, para muitos parece ponto assente que enquanto uma nave alienígena não aterrar em Alvalade, raptar parte dos ocupantes da Bancada Sul e levá-los para experiências numa galáxia distante que envolvam nuvens de poeira semelhantes a fuminhos, estrelinhas e outras cenas psicadélicas, Varandas continuará a presidir aos destinos do clube e estaremos condenados a (des)entendermo-nos. Imagine agora o Leitor que isso só acontecerá no ano 3000. Vai ser um fartote de famílias sportinguistas a fazerem a arvore geneológica à procura do último antepassado que viu o Sporting ganhar um campeonato. Ano 3000 em que se irão perfazer 998 anos sem ver o Sporting campeão. Pensem nisto apenas como uma ideia em construção, mas, se a única razão para manter Varandas, que curiosamente tal como Nitzsche é Frederico, é a repressão às claques, então talvez fosse melhor substitui-lo por algum sportinguista com as quotas em dia que actualmente integre o Comando Geral da Polícia de Segurança Pública. É que sendo certo que parte da Bancada Sul, com um comportamento que nos enche de vergonha, é hoje o seguro de vida de Frederico Varandas, importará saber o que será no futuro próximo o seguro de vida do Sporting. Desconfio que talvez passe pela fidelidade de sócios e adeptos ao clube e por um maior escrutínio aquando dos actos eleitorais. Só assim virá a bonança. 

 

O actual Mundo Sporting divide-se entre os que não aceitam opiniões diferentes sobre o que aconteceu no passado, os que não se entendem sobre o que está a acontecer no presente e os que discutem sobre o que virá a acontecer no futuro. Aparentemente, a única preocupação de sócios e adeptos é essa: divergir. E assim darem largas ao seu desporto favorito, o maniqueísmo, a grande marca do nosso ecletismo. Entretanto, numa realidade alternativa e sem grande relevância parece que o contador do Sporting-Benfica desta época está em 0-7. E estamos a 19 pontos do primeiro lugar no Lampeonato, ainda esta popular competição criada com o único propósito de glorificar o clube da Farmácia Franco vai a meio. Não que isto evidentemente cause qualquer tipo de preocupação, pelo contrário. Um sportinguista que se preze aguarda é pela abertura da London Stock Exchange para saber como estará a cotação do activo Bruno Fernandes. Lá está, tudo isso é um sinal de progresso: em tempos idos teria sido o LSD a nos fazer navegar para uma determinada percepção da realidade, agora é o LSE. Uma evolução, portanto, na linha de uma gestão de topo sempre à procura da inovação...

 

Se as claques são o seguro de vida de Frederico Varandas, teme-se que só Silas segure Tiago Ilori. Este - informação reputada de fidedigna que recolhi "à la carte" enquanto comia um bacalhau à braz numa tasca junto a um estúdio da TVI - , é um dos 4 Cavaleiros do Apocalipse que nos vem revelar no presente as coisas que acontecerão em breve à medida que se vai desenrolando o manuscrito já composto por sete selos vermelhos. 

 

Porém, estamos condenados a estar juntos. Podemos mudar de carro, de casa, de namorada ou namorado, de emprego, cidade, país, ou até de nacionalidade, mas a natureza do amor a um clube é incorruptível. Tão incorruptível que preferiremos sempre os sócios e adeptos moderados que nos criticam, porque nos corrigem, aos que nos elogiam, porque nos corrompem. Já o dizia Santo Agostinho e é bem verdade. Sporting sempre!

 

"Always look on the bright side of life"

 

Tenor "Tudo ao molho...": Marcos Acuña

 

P.S. Apocalyse=revelação

sportingbenfica (1).jpg

12
Jan20

Tudo ao molho e fé em Deus - Epidemias


Pedro Azevedo

Bruno Fernandes, Acuña e Mathieu são a equipa do Sporting, havendo ainda o Coates e o Vietto que funcionam como um placebo que nos faz sentir mais confortáveis. O Bruno, então, é meia-equipa. Saber que meia-equipa está a ser leiloada em Inglaterra é uma angústia que tira o sono até a um adepto com narcolepsia. Bem sei, os leiloeiros não são uma qualquer Christie's ou Sotheby's desta vida, mas sim uma Estrutura que nos dá boa-esperança com o seu trabalho invisível no futebol. Ainda assim a preocupação é legítima. O raciocínio é simples: se com a equipa completa estamos atrás de um clube recém-promovido à Primeira Liga, teme-se que sem meia-equipa o Famalicão se torne um gigante Adamastor. Neste transe, não tendo alternativa em termos de calendário e legitimamente defendendo os nossos interesses, enquanto não nos aventuramos na tentativa de dobrar esse cabo das tormentas, fomos treinar ali para os lados do Cabo Espichel.  

 

O treino foi uma boa mostra daquilo que nos espera no futuro próximo. Já sabíamos que tínhamos de fugir ao contágio da epidemia de gripe, mas nada nos preparara antecipadamente para gatos pretos agoirentos a passearem no relvado, adeptos desavindos nas bancadas ou apanha-bolas de máscara na pista, para não falar de presidentes desentendidos nos camarotes. No meio disto tudo, o jogo durante muitos minutos pareceu ser uma coisa acessória. Tão acessória que se não fosse o frio que se fez sentir no Bonfim este Vosso humilde escriba até teria entrado em REM, com pesadelos vividos de ver Bruno Fernandes a marcar os seus últimos golos pelo Sporting. Ainda assim, sonhando acordado, lá vi o Bruno a resolver um jogo que pareceu ganho mesmo antes de ser jogado e que esteve à beira de acabar empatado. É que se os de Setúbal, mesmo apenas com 4 titulares, tiveram de recorrer ao Brufen e Benuron, os nossos devem ter esgotado ao intervalo as doses de ansiolíticos. De tal modo que no segundo tempo não se percebeu se era o Sporting que estava em campo ou o Neuchatel "Xanax", o que se traduziu em algo como levarmos o nosso masoquismo ao sado. À conta disso sofremos um golo, estivemos à beira de levar outro e o Coates ainda teve de fazer uma falta que o impossibilita de jogar contra o Benfica e abre a torturante possibilidade de o Ilori o fazer. Como se não bastasse, o Vietto saiu a coxear. E assim, enquanto aguardamos a todo o momento notícias do Grande Prémio de Inglaterra em BF8 que sucede ao Grande Prémio do Mónaco da mesma modalidade disputado no Verão passado, excruciantemente esperamos pela próxima sexta-feira. Mas ainda há esperança: pode ser que o Benfica se compadeça com esta epidemia que desde o início da época grassa em Alvalade e aceite adiar o jogo... 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Bruno Fernandes

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Castigo Máximo

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

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