A alma de Kolisi deu asas ao sonho de Mandela
Pedro Azevedo
A África do Sul partia para a final do mundial de rugby como o "underdog". Do outro lado estava a poderosa Inglaterra, grande favorita à vitória final. Tudo assentava numa espécie de silogismo: os "Springboks" sul-africanos haviam perdido bem contra os "All Blacks" neozelandeses (fase de grupos) que por sua vez tinham sido derrotados convincentemente pela selecção da Rosa (meias finais), logo a Inglaterra devia naturalmente vencer.
Acontece que os sul-africanos não estiveram de acordo. Tudo começou na estratégia de jogo e na palestra motivacional do seu treinador, o conhecedor Rassie Erasmus (a fazer jus ao nome). Depois, prolongou-se no campo através da acção de liderança de Siya Kolisi, o primeiro capitão negro da história dos "Springboks", que no final do jogo teve este discurso inspirador: "Viemos de contextos diferentes, distintas raças, mas juntamo-nos com um único objectivo: alcançar a vitória no Mundial e mostrar à África do Sul que quando estamos juntos, conseguimos tudo". Mandela, em cima, no Céu, deve ter sorrido embevecido...
O jogo ficou marcado pelos pontapés de Handre Pollard, o experiente médio de abertura sul-africano, que desde o apito para o início da partida foi estabelecendo a diferença no marcador, apoiado no desempenho dos seus valorosos avançados (o número 8, Vermeulen, foi considerado "Man of the match") que foram ganhando sucessivos "rucks" e faltas. Destaque também para a acção dos talentosos pontas Mapimpi e Kolbe, os quais foram decisivos na fase final do jogo com ensaios obtidos através de movimentações onde combinaram velocidade com inteligência e/ou trocas de pés estonteantes.
Com esta vitória, os "Springboks" estão agora a par da Nova Zelândia como as selecções com mais vitórias em mundiais (3), com a particularidade de os sul-africanos terem ganho sempre com intervalos de 12 anos (1995-2007-2019). Uma palavra de apreço para o Japão, país que organizou um Mundial fantástico, com muita festa nas bancadas. Uma celebração da vida, não do ódio. Aliás, digno de destaque foi o "fair-play" de todos os intervenientes, desde árbitros (sempre a privilegiarem a prevenção em detrimento da repressão), treinadores, jogadores até ao público presente. O rugby, mais uma vez, a dar uma lição de civilidade a todos os amantes do desporto em Portugal e no mundo.
Kolisi recebendo a Taça Webb Ellis com De Klerk (influente Médio de Formação) a seu lado